segunda-feira, 28 de setembro de 2015

The Lucifer Effect

E depois há os que agridem escolhem agredir porque podem. Simplesmente por isso. E isso do "poder" não corresponde, tão somente, ao escolher fazê-lo porque acordaram para aí virados. Nem toda a gente, mesmo querendo, pode escolher agir livremente de determinada forma. Os que agridem porque podem são aqueles que nasceram, ou encalharam, ou se movimentam num determinado círculo - familiar, social alargado ou mais restrito, profissional, sei lá - onde certas condutas não só não são censuradas ou reprimidas, como são entendidas como manifestação de superioridade, e exaltadas. É assim mesmo. Ou és caçador ou és a caça, that's how they roll. Escolhem agredir porque podem, e podem porque - já o sabem à partida - o acto não traz quaisquer consequências nefastas. E depois, claro, há milhentas graduações. Desde o sociopata puro que, ao comando de uma empresa, afirma sem vergonha que paga o menos possível a quem para si trabalha, ou aqueloutro que comercializa um medicamento que é a diferença entre a vida é a morte para tantos, mas hélas, o mercado manda, e vamos de o aumentar para preços incomportáveis. Passando pelo cão de fila que não é mais que um poodle, mas não perde oportunidade de mostrar os dentinhos e latir esganiçado, pensando que com isso alcança algum estatuto melhor que o mero bicho de estimação - good dog!, you good dog! - não tendo a inteligência de perceber que nunca passará do colo ou da porta de entrada, um capacho conveniente. E depois há o resto. Os deslumbrados com os olhares de receio, e que acumulam endorfinas cada vez que põem alguém na ordem, a nu, no seu lugar. Os que fazem claque, tão parecidos com os poodles, os bobos, e até os espectadores silenciosos. Tomar consciência do que nos motiva, reflectir, ter a coragem de dizer não, isso é que era. Mas dá tanto trabalho, nenhum homem é uma ilha, e correr o risco de ser segregado ou, pior, passar a linha ser empurrado para o lado dos agredidos, isso é que não.

26 comentários:

  1. O teu texto é tão tristemente verdadeiro e actual.
    Além disso agredir está na moda. E agredir verbalmente e/ou emocionalmente não é considerado sequer agressão. É, muitas vezes, apenas a "coragem de ter uma opinião". Quem não agride é considerado fraco, quem não responde com agressão à agressão é considerado fraco.
    Até quem defende os agredidos o faz, tantas vezes, apenas para a aparecer como se essa atitude fosse por si e não pelos outros.

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    1. Patrícia, ninguém é perfeito, e já fiz muitos mea culpa. Quando era chavala levei com muita coisa, e tantas vezes respondi à chapada. Ou com veneno. Depois um gajo cresce e começa a questionar-se, e a perceber que não vale a pena lutar com as mesmas armas, até porque perdemos sempre, e perdemos ainda respeito por nós. Mas enfim.

      (o mundo era um sítio melhor se toda a gente seguisse atentamente o feice do Humans of New York. cada post que leio faz-me pensar tanta coisa, e querer ser melhor.)

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  2. Irritam-me todos os pequenos poderes. Irritam-me muitíssimo. E também me fazem algum medo. Penso sempre que se com aquele pequeno, ínfimo poderzinho são o que são, nem quero imaginar o que seriam com real poder.

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    1. O poder é uma ilusão, seja grande ou pequeno, e faz-me imensa aflição haver quem o valorize tanto, sinceramente.

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  3. Sabes, às vezes não dá jeito...

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    1. A mim também há imensa coisa que não me dá jeito... trabalhar, então... :D

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  4. (esse livro, esse livro... or how good people turn evil - e é por isso que amo a minha área de paixão)

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    1. É uma experiência do caraças e que hoje em dia não seria possível (acabava tudo preso, mesmo a sério), devia ser ensinada na escola. Outra que também me maravilha, mas onde ninguém se aleijou, é aquela em que pessoas são pagas para, a determinada ordem, carregarem num botão ligado a um aparelho e, cada vez que o fazem, alguém na sala ao lado grita de dor. O que é giro (not) é que muitos continuaram a carregar. E, perguntados porquê, ou sobre o que achavam que se estaria a passar ao lado, ou se nunca se questionaram sobre se o seu acto estaria a causar sofrimento a alguém, estas pessoas afirmaram coisas como não ser nada com elas, estavam a fazer o que lhes tinham mandado / o que eram pagos para fazer. Maravilhoso de assustador.

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    2. A psicologia social explica. É por isso que sou mais crente na crueldade inata - e que o que custa é educar para o contrário, para a bondade, para a tolerância. A ruindade já vem pré-definida, então dando-lhe asas... ;)
      (o livro - e as experiências - são muito úteis para compreender os fenómenos que se passam em cenários de guerra - como aquela história da prisão de abu grhaib - ou a actuação dos soldados nazis, etc etc. É uma grande experiência - mas completamente antiética -, importante para se perceber que não são só as más pessoas que fazem más coisas. Todas as pessoas, em certas condições, têm potencial para ser bestas)

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    3. Mas há sempre as excepções, e é para elas que temos de olhar, e é com elas que temos de aprender. Lá está, tenho alguma fé nisto, e também tento, né. "Tentar" é a palavra chave :D

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  5. Isto do agredir só porque se pode é especialmente nítido aqui na blogosfera. É extremamente assustador as agressões que são tantos dos comentários a blogs mais famosos aqui da praça. Não nutro especial amor por nenhuma dessas bloggers mas o veneno gratuito que é destilado naquelas caixas de comentários faz-me encolher os dedinhos dos pés por saber que há pessoas capazes de distribuir maldade de forma tão pronta e inusitada. Pessoas que não sabem distinguir liberdade de expressão de sensibilidade básica humana são muito pequeninas e muito poucochinhas.

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    1. Há pessoas que não têm muito filtro, não. E têm muito gozo nos seus cinco segundos de fama :D Anyhoo, têm toda a liberdade de ter falta de chá, e os donos dos blogs têm toda a licença e liberdade de deitar certos comentários no lixo. É que há quem ache que a sua liberdade de expressão tem como correspondente o dever de outros lhes darem tempo de antena, só que não.

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  6. Uma das co-autoras do Pipi a falar sobre agressões, sim senhora!
    Tens uma moral para falar. Nunca nos blogs se chegou tão baixo como lá, mas aqui estás tu, a cagar sentenças, como se não fosse nada contigo.

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    1. "To improve is to change; to be perfect is to change often." W. Churchill
      "Be the change you wish to see in the world" M. Ghandi

      Eu tento, e a/o anónimo?

      "The weak can never forgive. Forgiveness is the atribute of the strong." M. Ghandi
      "Darkness cannot drive out darkness, only light can do that. Hate cannot drive out hate; only love can do that." M.L.King

      "Herrar é umano" anon.

      Força nisso, e muita luz.

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    2. Um grande "Like" (aquele que se escreve (Y) ) para a tua resposta a tal parvoíce.
      De uma pessoa (eu) que até foi bastante prejudicada por causa do Pipi e de gente tontinha. Ou má.

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    3. Aqui entre nós, Teresa, eu também fui mais prejudicada do que tirei proveito.
      (e já lá vao mais de quatro anos, e há gente com memória elástica)

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    4. Fui um dos alvos das Pipis, quer dizer, acho que escreveram dois posts sobre o meu blog, isso tudo espremido, não faz de mim ou do blog, um alvo. Adiante. Acho que conheci o blog quando escreveram sobre o meu, depois ia espreitando, mas nunca fui muito assídua, acho que lá para o fim começou a descambar. Muito honestamente se me perguntarem o quê de quem, já não sou capaz de dizer, só o que se passou comigo e que já relativizei há muito tempo, resolvi com quem interessava e fim. Não faço a menor ideia se foste tu, nem me interessa, nunca me interessou e tenciono continuar assim. Gosto do que escreves agora e é por isso que venho cá.

      Vida para a frente, já não se aguenta isto, sempre a remoerem as Pipis e nhanhanhanha. As pessoas mudam, não necessariamente para melhor, nem para pior, mas mudam. Siga ;)

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    5. Mac, para mim é um capítulo encerradíssimo. Se hoje, sabendo o que sei, me metia naquilo? Nem por sombras. Foi uma lição de vida, e de humildade, que não vou esquecer. Ponto.

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  7. Izzie, também incluo aqui um comentário ao seu posto mais recente.

    O Pipoco veio com a argumentação de que ninguém deveria levar a sério as ofensas nos blogues - isto enquanto ofendia a Pólo e a Luna - que isto eram só blogues.
    O meu comentário, que mencionava que o problema da blogoesfera era a toxicidade, não foi aprovado.

    Uma toxicidade que se alimenta dos amiguismos e que acaba fomentando comportamentos ou criminosos ou, pelo menos, tóxicos.

    No Pipi, não haveria lugar para novos como o da Barca Velha e, se a linha editorial da PN poderia ser criticada, também o seria a da SMS. Admito, alguns posts eram exagerados, mas nunca repugnantes.

    Ofender os outros recorrendo à saúde mental é abjecto. Pouco interessa se é num artigo de jornal ou num Blog. Admito que, na sequência de um desses posts quase disse a uma Blogger que o Nick dela parecia o de uma pita virgem num colégio de freiras que se benzia só de ouvir falar em masturbação. Ainda hoje não sei se fiz bem em contar-me.

    Não é só fazer mal por poder, é a rodinha de amigos que se apoiam. É uma Blogger escrever que o comportamento da PN caiu do céu, é a censura a comentários que criticam determinada Blogger, em vários blogues.

    Custa a respirar na blogoesfera.

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    1. Anónimo/a, pensei muito antes de publicar este comentário, e não por causa do teor (é educado, não agride ninguém), mas porque não queria pisar mais este tema.

      Espero sinceramente nunca ter escrito nada repugnante no pipi. Eu acho que não, mas ninguém é bom juiz em causa própria. A minha linha era nunca escrever nada que me magoasse, se fosse sobre mim. Como já disse ali em cima, era experiência que não repetiria.

      Quanto ao post do Pipoco, não tenho muito a dizer. Confesso que o meu conceito de ofensa é muito elástico, e não vejo como tal uma boca a picar, uma picardia. Claro que os visados têm todo o direito a ofender-se, mas a liberdade de ofender, de exprimir uma opinião, por muito desagradável que seja, impera. Os limites são os da lei penal: quando se cruza a linha para o insulto ou imputação de factos falsos ou torpes, aí toca outra música. E aqui está: alguém terá a liberdade de me atingir pegando no facto de eu admitir, sem vergonha, sofrer de depressão (em tratamento, actualmente muito latente) há 25 anos? Tem, sim senhor. É bonito? Cabe a cada um julgar. Também acho abjecto. Como acho abjecto troçar do estrabismo de fulano, ou peso de sicrano. E pior: é fácil, é pouco inteligente. Mas lá está, cada um diverte-se com os brinquedos que tem habilidade para manusear.

      Agora outro ponto: concordo que existe alguma toxicidade na blogosfera, como na vida em geral. Quando se juntam muitos umbigos no mesmo espaço, shit happens. E quem atira merda a uma ventoinha tem de se preparar para as consequências. Eu não atiro, e gosto pouco que me acusem de o fazer, ainda que veladamente. Não atingi ninguém em particular com qualquer post aqui publicado. Posso ter opiniões sobre comportamentos, fenómenos, etc, mas abstenho-me de visar A ou B. Se A ou B se sentem visados, problema deles. Armar escarcéu por isso, e atirar-me bosta, é que não. E por isso quero ficar fora de certas cenas tristes e ambientes com que não me identifico, e agradeço que não me puxem para conversas que não são minhas nem quero manter.

      Aqui, no meu canto, não me custa respirar. É evitar ambientes poluídos ou hostis, e aos outros também não custará ;)

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    2. Para mim, e já o disse inúmeras vezes, não são só blogs. Não são só blogs a partir do momento em que o meu pai lê o meu blog, em que pessoas da família do meu namorado lêem blogs, pelo que o que se passa na bloga para mim não se encerra quando desligo o computador, mas pode muito bem vir a ser assunto de conversa em almoço/jantar de família em casa dos meus sogros, como aconteceu com vários posts em que me insultavam directamente. E isto mói, chateia, afecta. Pelo menos a mim, e como tal, o afastamento acabou por ser a minha forma de defesa, que foi o que disse no blog do Pipoco. Não estou para me chatear porque me faz mal. Se para uns são só blogs, para mim são pessoas.

      Agora não deixa de ser irónico que se queixem dos tempos negros na blogosfera e das reacções exacerbadas a qualquer coisa que se diga, e depois se faça um drama relativamente a um singelo comentário meu que visava apenas a minha experiência pessoal relativa a posts, bocas, headers e afins usados com o intuito de me picar e chatear, com mais ou menos intensidade.

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  8. todos nós temos o potencial para embarcar nos pequenos poderes (também é por isso que o comunismo não funciona, mas não queria entrar por aí). saber que dentro de nós há um pequeno ditador é meio caminho andado para não o fazer, mas é uma escolha. Como a Luna diz, às vezes não dá jeito...então quando se está na mó de cima... (quantos caloiros não aguentam as praxes com a ideia de que no ano a seguir serão eles a praxar??)

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    1. Ah, Fuschia, reconhecer o tiranete que habita em nós: esse é um exercício fundamental! Todos, mas todos os seres podem, em determinadas situações, lixar ou dificultar a vida alheia, só porque sim.

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  9. Já agora: não vou aceitar mais comentários sobre o post de cima. É um post que vai desaparecer daqui a um ou dois dias, conforme me apeteça. É um ponto de situação que não repetirei e não vou debater.

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  10. E pronto, acabaram os comentários neste post. finita la comedia.

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