terça-feira, 30 de junho de 2015

The great pretender

Quando um gajo se mata a trabalhar para não morrer de ralações.

Psycho killer

Tenho um sonho, um sonho mui singelo, apesar de ilegal: um dia pegava em todos os motivadores da treta que apregoam inanidades como a vida resolve-se sozinha ou é preciso fazer aquilo que nos apaixona ou acredita e atreve-te ou tu consegues, tens é de trabalhar para isso, e caracinhas do mesmo teor, tirava-lhes tudo, o tecto, o rendimento, a rede de apoio (sim, família, amigos, tudo), a saúde, a certeza do jantar mais logo, o sossego de saber o amanhã, e ia largá-los ali a dormir numa caixa de cartão, nas arcadas do Martim Moniz, a ver o que acontecia. Façam lá uns workshops motivacionais entre os locais, façam; larguem lá umas larachas positivas e encorajadoras, larguem. Alguém há-de recolher o vosso cadáver.

segunda-feira, 29 de junho de 2015

The final countdown

Custa-me imenso que haja quem se congratule com a desgraça alheia (e mais ainda porque a acham merecida), mas não consigo entender que haja quem não entenda que a União Europeia é só tão forte como o seu elo mais fraco.
Avizinham-se tempos aterradores, e há quem ainda não tenha aberto os olhos para além do seu umbigo e vislumbrado que a Europa está cercada. Isto não é só uma questão de dinheiro. Antes fosse.

sábado, 27 de junho de 2015

That perches in the soul


O direito do mais forte à liberdade

Quando era pequinititxa, mesmo ali na pré e primeiros anos da primária, tinha uma amiguinha, aquilo a que se chamaria a melhor amiga, que era uma pessoa, como direi, não é bem de personalidade forte, era entre isto e o atirar para o impositivo, alpha bitch, totalmente. Sempre que havia uma discordância, uma diferença de opiniões - e, naquelas idades, para surgir uma discussão que caiba neste espectro basta lançar um tema como "a que é que vamos brincar agora" -, e calhava eu não ceder, era um sarilho do caneco.
Note-se, apesar de eu ser bastamente conhecida pelo mau feitio e teimosia, a verdade é que, perante situações de impasse por coisas que não sejam de fundo ou implicassem um enxovalho superior ao que seria capaz de tolerar, eu cedia. Tudo a bem da paz (podre, verdade), e porque, enfim, há batalhas que não vale a pena travar.
Mas, de quando em vez, ela fornicava-me o juízo mais do que achava que devia contemporizar, e impunha-me. E ela, bom, reagia como reage uma criança habituada a levar a sua avante, pouco habituada a colocar-se no lugar do outro, ou a tentar perceber outras perspectivas. Zangava-se. Deixava de me falar, "já não sou tua amiga!", um drama do caralho. Mas não se ficava por aí. Acto contínuo, lançava-se na campanha de se eleger a vítima da malvada da Izzie, buhuuu, que a contrariou, e houve ainda aquela vez que. Isso mesmo: ia de coleguinha em coleguinha, fazendo o número de coitadinha, contando agravos presentes e passados, como eu era má, feia, e que não se dessem comigo, porque "tu és minha amiga, não és?".
E eu? Bom, eu ficava triste, claro que ficava. E não fazia mais nada. Para além de não nunca ter sido uma criança propriamente expansiva, que tivesse lata de andar, depois de uma zanga com a bff, a angariar um piquete de piedade e amizade com a minha pessoa, achava aquilo tudo muito palerma e desnecessário. E ficava no meu canto. Triste. Mas sem o deixar transparecer, às tantas - sim, estas cenas repetiam-se, assim como se repetiam a reconciliações e posteriores recidivas. E, se ficava triste com a atitude dela, mais triste ficava com a atitude das demais que, sem se cansarem a impor-se, ou averiguar seja o que for, se colocavam do seu lado. Achava uma injustiça. Aos poucos, e à custa de repetições, percebi que não o fazia por maldade ou pura parcialidade; era apenas um descaso, um desinteresse, um não se querer chatear com uma briga que não era delas. Entender isto capacitou-me para lhes perdoar um bocadinho. Afinal, não era mesmo com elas, pois não? Mas, ainda assim, magoava-me que fossem assim deixa-andar. Que fossem permeáveis à primeira - e única - abordagem, e tão facilmente deixassem de fazer caso de quem não tem estrutura para andar a cativar simpatias,a exigir solidariedade absoluta, a açambarcar a companhia com o propósito de também me privar dela.
Lembro-me de muitas vezes pensar que era tudo tão estúpido, tão poucochinho. De me animar pensando que um dia as coisas deixariam de ser assim, a vida já não seria um recreio de escola, as pessoas seriam crescidas e capazes de dizer a alguém, com estas atitudes, "hei, calma aí, resolve os teus assuntos com quem tens de resolver, mas não venhas tentar antagonizar, eu gosto da X e vou continuar a dar-me com ela." Mas não, parece que ninguém faz isto. É engraçado, porque eu faço. Se calhar (?) sou muito, muito estúpida, mas se alguém me tenta encurralar, isolar de outra pessoa só por causa de um diferendo lá entre elas, reajo mal, muito mal. Nunca me peçam para escolher entre a espada e a parede. Nunca me tentem afastar de alguém só porque passou a ser pessoa non grata a alguém do grupo. Nunca.
Ainda assim, percebo quem não reaja da mesma forma. É a tal coisa da paz social. As pessoas já têm muito que as rale, vão agora tomar posição numa situação destas. Deixam andar. A sério, percebo. Desprezo um bocadinho a falta de espinha, mas percebo. Afinal haverá muito quem pense que, se calhar, e porque eu não o mostro, se calhar também não me importo. E como não faço campanhas, se calhar também pensam que mais vale ficarem com quem se aproximou, e não com quem ficou ali, na boa, a ver o que acontecia, a confiar que, nã, vai lá ser tudo igual outra vez. Mas é. É uma constante. O elo mais fraco é descartado - não, esquecido. Como não se faz notado, é natural, ou habitual que assim seja.
E pronto, as coisas seguem. São como são. Tudo na mesma, como a lesma. E eu vejo-os a ir. E razão tinham os romanos, uma paliçada dá uma trabalheira a levantar, mas a probabilidade de se apanhar pancada lá dentro é muito menor.

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Welcome to the Twilight Zone (4)

- Qual é a vantagem competitiva de uma low cost quando uma passagem aérea, para exactissimamente os mesmos dias, custa apenas menos cinquenta parrecos que na companhia nacional - onde temos direito a lugar marcado e bagagem de porão, e aterramos num sítio muito mais central, com ligação de metro ao centro da cidade?

- Devo estar mal habituada, residente que sou numa cidade onde os hotéis nascem como cogumelos, mas por que caraças é tão complicado encontrar uma instalação hoteleira em Londres que leve ali à roda (ou menos) dos cem pastéis por diária, e tenha uma classificação igual ou superior a sete em dez?

- E agora perguntariam vós, ó fulana, Londres, Londres, tu tens problemas, caneco, sempre Londres. Ora, porque sim. E derivado disto:


David Suchet, como Lady Bracknell. Sim, eu recebo newsletters com novidades destas. Sim, eu gosto de sofrer.


quinta-feira, 25 de junho de 2015

Houston, we have a problem

Se alguma vez vos perguntarem se é possível andar coisa de quinze dias com a mesma dor de cabeça / moinha, respondam que sim. Se vos exigirem provas, arrolem-me como testemunha.

quarta-feira, 24 de junho de 2015

I'll make the most of it, I'm an extraordinary machine

Que seca, hein? Primeiros a gaija desaparece, depois a gaja aparece, e anda neste mói que remói, adondes anda a fermosa mas segura, a da verborreia verrinosa, a especialista em assuntos imbecis e entediantes, a dos quotidianos sempre maçadoramente iguais, a das birras estridentes, a dos sarcasmos acutilantes, a dos resmungos inconsequentes, adondes anda essa tal de Izzie? Não faço ideia. É um mistério tão denso como sempre foram outros, tais como a exacta localização de Avalon ou a secção de perdidos e achados da carris. A Izzie anda por aí, à procura das migalhinhas que traçam o caminho, o X que marca o local. Perdeu-se, a mafarrica. E, pasme-se, já não lhe apetece rir todos os dias, a parvalhona. Está feita uma matrafona de angústias e incertezas e, pior, nota-se. Se-ca. Qualquer dia volta a carregar demasiado no eyeliner e a vestir-se de preto integral, querem lá ver. Demodée. Out. Dorme-se aqui, à espera que lhe caia um raio que a electrize, ou a mande de vez para o mesmo raio que a parta. Cha-ta. Assim não vale a pena, realmente. Tss tss tss.


terça-feira, 23 de junho de 2015

I can't go on. I'll go on.

Se um dia me perguntarem qual foi o momento mais triste da minha vida, e se esse dia for amanhã, já sei que resposta darei.

Always look on the bright side of life

Coração ao alto, que isto um dia ainda vai dar um romance do caracinhas, é preciso é aproveitar enquanto o hype das autobiografias trágico-psicoanalíticas está em alta.


[e talento! talento e alento para a escrever! bolas, lá estou eu outra vez em curva descendente]

domingo, 21 de junho de 2015

Hope is the thing with feathers

Quando era miúda e me chateavam com a conversa do "então em que acreditas tu?" - ser agnóstico ou ateu é sofrer, as pessoas crêem, com toda a sua força, que toda a gente tem de acreditar em alguma coisa, pun intended - eu, enfadada com o interrogatório, e sem força para me defender do que seguiria a um "nada", acabava por responder "na humanidade". Era mais verdade do que gostaria. E continua a ser. Chame- se espírito humano, humanidade, sim, creio. E um humanista também tem os seus desafios e provas de fé, que tem. Seja uma pessoa, um percalço, um acontecimento particular, ou algo maior. Se pomos fé em algo tão difuso também é verdade que temos fé em pessoas mais concretas, e às vezes, tantas vezes, basta falhar-nos uma destas para termos o nosso momento gólgota, levantar a cabeça para o alto, e questionar porque nós abandonaram.
E depois há as coisas grandes, terrificamente grandes. Sei lá se é tpm, uma especial ou sazonal sensibilidade, mas as notícias de Charleston tocaram um nervo muito especial, aquele que faz fechar a garganta e apertar os sacos lacrimais. Podia ter acontecido numa igreja, num jantar de família, numa reunião de amigos, o que me tocou lá no fundo foi o horror de gente pacificamente reunida poder cair assim, vítima do ódio absurdo de um cabraozeco qualquer, um canalha consumido por ignorância torpe, e o mais vil desrespeito pelo próximo. O meu mal estar adensou-se enquanto a história se desenrolava: a idade do... Coiso, que nem animal se pode chamar àquilo. As circunstâncias em que se viu na posse de um instrumento de matar célere e arbitrariamente. O ideário que cultivava. A bandeira da confederação a ondular, indiferente, num edifício governamental (não fazia ideia, nem queria acreditar!). E, por fim, o aparato da detenção do indivíduo, sendo conduzido, pacificamente, pelas forças da ordem, escoltado e protegido pelos corpos dos seus membros, torso blindado por um colete à prova de bala, ou não fosse um celerado (de um "preto"?) desfazê-lo à bala. E, tão próximas, outras imagens, a de uma garota de bikini a ser atirada ao chão, manietada, algemada. Um garoto a brincar com uma pistola de brinquedo abatido como uma ameaça iminente. Policias sentados em cima de um "suspeito" que implora "I can't breathe". Tantas imagens. Uma pessoa sente um golpe, nestas alturas. Perde-se, mesmo. Não vale a pena, sente-se.
Mas depois, lê-se as palavras de um familiar de uma vítima, perante a notícia da prisão do carrasco, e são palavras de perdão. De repente, uma pessoa que não conhecemos, nunca veremos à nossa frente, uma só pessoa, de quem nem sabemos o nome, essa pessoa prova que afinal vale a pena, isto de crer nas pessoas. E essa pessoa, sem saber, faz-nos ter vontade de ultrapassar qualquer dor, que nem de longe se aproximará da sua, e voltar a ter a tal fé. Que não é só no outro, mas naquilo que representa, na sua centelha de humanidade. E é também uma fé em nós, na nossa capacidade de persistir em acreditar, por oposição ao desistir.
Se calhar é verdade, todos precisamos de acreditar em alguma coisa.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Rubber Soul

Como aquelas bolinhas saltitonas, muito rijas, muito chatas, que atiradas com demasiada força se tornavam um projéctil muito giro; toing-toing-toing, nas paredes, tecto, móvel, ai a jarra, ai a cabeça do mano; aquilo era indestrutível, por mais uso que se lhes desse nunca perdiam a capacidade de saltitar, sempre com a mesma energia inicial, depois esmorecendo aos poucos, a física explica, eu é que não; com o tempo iam perdendo o brilho e ficavam de uma cor pardacenta, foscas, algumas nicas aqui e ali - a jarra, a esquina da mesa - mas saltitavam ainda, todavia, quanto maior a força de arremesso maior a força e duração do saltitar, tau-tau-tau.
Claro que um dia perdiam a graça, a novidade; uma pessoa larga-as não sei onde, perde-as de vista, anos depois volta a encontrá-las numa caixa onde ficaram esquecidas, olha a bolinha, e atira-a, e ainda salta, ena. Antes assim rija, chata, fosca, que elástico; o elástico fica lasso, o elástico rebenta, o elástico não salta e ressalta, e nunca ninguém voltou a guardar um elástico velho, depois de o encontrar, esquecido, numa caixa qualquer.

domingo, 14 de junho de 2015

You broke my heart, Fredo

Aquele exacto momento em que sentes o teu coração estilhaçar-se em milhões de pedacinhos. O exacto momento em que sentes a onda de choque, o exacto momento que dura nada e uma eternidade, e o exacto momento em que vês as partículas de luz saírem-te do peito, e o rasto que deixam enquanto se afastam. O exacto momento em que sabes já não ser possível apanhar os pedaços e juntá-los, porque não os vais conseguir encontrar. O exacto momento em que percebes que é aqui que tudo muda, que tem de mudar, e não pode voltar. O exacto momento em que te perdes, sabes que tens de te encontrar, num um outro espaço, tempo, plano. O exacto momento em que nem vês nenhum mérito nessa já adquirida resiliência, e preferias antes parar, de vez. O exacto momento em que não sentes força para olhar em frente, não tens equilíbrio para te sentires no agora, e pensas o que foi com o desejo que antes não tivesse sido.
O exacto momento em que acabas será o exacto momento em que (re)começas, embora ainda não saibas e se calhar nem queiras saber. Mas é o exacto momento em que escolherás verter sangue, e não o teu, agora.

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Last F**kable Day

[porque Junho é mês de aniversário(s). medo.]

Então bom dia, Lisboa

Começar bem o dia? Indo buscar uma encomendinha ao Parque das Nações. Pá, que cu de Judas. Ou onde este perdeu as botas. Sim senhora, a construção é moderna, há arvorezinhas, mas pá. O trânsito, o trânsito! Sim, porque dali não se vai a lado nenhum sem ser de carro. E que carros. Tantos de marca Patus modelo Bravis. Mas ai de quem disser que aquilo é um dormitório, um amontoado de prédios, um subúrbio em fino! Cai-nos logo em cima o Carmo e a Trindade. Qual subúrbio. Embora as coordenadas estejam ali mais perto de um Sacavém, ou uma Moscavide, Le Parque é la créme, nada de confusões. Novidades: passou-se o mesmo noutras décadas do passado. Lumiar (ali para Santa Clara, Quinta das Conchas ou do Lambert, ou mesmo a tal de Alta, coladinha a habitação social), Telheiras, tudo subúrbios mas um nadinha menos periféricos que os outros, habitat preferencial da classe média-alta emergente. Ah, a soberba com que Telheirinos e Lumiarescos olhavam os outros, os mesmo-mesmo suburbanos. Fofos, é igual. Apenas mais recente. O estilo de vida, de urbanismo, de trânsito, de transporte, é tudo igual. Ah, temos o rio. Tem graça, é o mesmo corpo de água que banha o Barreiro e Almada. E vocês ficaram com a mosquitada e melgaria toda, calha bem.
Cereja no topo do bolo: quarenta minutos para chegar ao trabalho, nas Avenidas Novas. De casa, e de carris ou metro, não levo mais que meia hora. Sim, sim, é um privilégio morar ali. Então não?

quinta-feira, 11 de junho de 2015

A lady of a certain age

Outro dia referi-me a um grupo de mulheres sub-30 como "aquelas garotas".
Cruzes, qualquer dia ainda pensam que eu tenho mais de cóóóóórenta.

[antiga e acabadíssima, credo.]

Welcome to the Twilight Zone (3)

Estás parada no stop, à espera que o trânsito te dê uma abébia, pela tua esquerda chega uma moto da polícia municipal que abranda (vá lá) e entra.


Welcome to the Twilight Zone (2)

Quando uma peixeira se queixa do cheiro a peixe da banca da vizinha.

segunda-feira, 8 de junho de 2015

I want my MTV

Passadas já quase duas semanas, e apesar da minha épica resistência à dor (três pós-extração de sisos sem analgésicos, vai buscar) decido que se calhar já é altura de esquecer a não menos épica miúfa do dentista, fazer-me uma mulherzinha crescida e enfrentar a coisa. A bem dizer, se calhar isto não é (só) inflamação de maxilar derivada de bruxismo muito acentuado (têm sido uns dias semanas meses complicadas, 'tá?), se calhar o siso final precisa mesmo de sair, se calhar era giro passar a conseguir mastigar uma refeição inteira em tempo normal, se calhar, desta vez, meto um ansiolítico no bucho antes da consulta. Estou há coisa de uma hora a olhar para o post it com o número da clínica.

Everybody's crazy 'bout a sharp dressed man

Não fiquei nada surpreendida com o aventar da hipótese de Socras optar, entre a prisão domiciliária e a de Évora, por esta última. Também já morei numa casa assim.


sexta-feira, 5 de junho de 2015

Don't have a cow

Percebo perfeitamente o misto de antipatia e gozo que os vegans suscitam: são pessoas muito chatas. Para ser justa, não são as únicas pessoas muito chatas, nem serão as mais chatas, mas são chatas que se farta. É natural, o proselitismo faz pessoas muito chatas. E, quanto mais minoritária é uma determinada corrente de pensamento, filosofia de vida, crença, mais chatos são os seus defensores. É assim, e não tenham dúvidas: aqui há coisa de 2000 anos os cristãos eram gente muito, muito chata, e prova disso era o gozo com que os seus opositores os eliminavam, empregando requintes de malvadez de um grafismo marcante.

Mas, sejamos ainda mais justos: o facto de serem muito, muito chatos, a pontos de ninguém manifestar o desejo de repetir a experiência de os ter como companheiros de mesa num jantar (been there, done that, got the t-shirt), não significa que não tenham razão em algumas coisas. Os relógios parados também acertam duas vezes por dia, os vegans não são excepção. Têm é uma forma muito, muito chata (repito-me, eu sei) de ter razão. E escolhem mal as batalhas. E não têm noção de timing. Nem estratégia comunicacional. 

Ora bem, voltando à tal da razão. É verdade que nós, os omnívoros, gostamos de separar as águas, e até de nos incluirmos no grupo dos animal-lovers, mas, hélas, temos de comer, e isso é natural, e iada-iada-iada. Mas, indo ao fundo da questão, e sendo verdade que temos de comer, não existe uma diferença ética significativa entre degustar um canídeo, um gafanhoto, ou uma bela febra de porco preto. Só uma diferença civilizacional, geográfica, cultural. A verdade é que, nos entretantos, um bicho morre. E um bicho é, de facto, um ser senciente, sabemo-lo agora porque science, bitch. (Achamos que os vegetais não são, mas mantenhamos a mente aberta.)

E pronto, é isto, comer animais implica morte dos ditos, e ou vivemos com isso ou não. Eu vivo, não significa que goste, e até admito que se tivesse eu que executar um para o jantar marchava antes sopa com salada. Até vou mais longe, incomoda-me uma nica, mas pronto, vivo com isso, e não faço distinções entre espécies, do género “a Cornélia merece morrer para me alimentar mas nem toques no Bobby”. Portanto, concordo com os vegans quanto ao “especismo”, i.e., hierarquização das espécies animais conforme nos dá mais jeito, e mata-se uns porque se come e os outros têm direito à vida porque são fofos. Acho que racionalizar este entendimento é hipócrita e não tem fundamento ético, adiante. 

Sem embargo, e numa base puramente emocional, é claro que me faz mais impressão a morte ou utilização de um chimpanzé em experiências que um ratinho, o primeiro partilha mais de 90% de adn connosco, e admito, e friso, que isto é puramente emocional, que afinal no grande plano das coisas somos todos carbono vivo e tal. Resumindo, não me sinto melhor pessoa por ser omnívora, mas também não me sinto (muito) pior pessoa. É uma opção, vivo com ela, e não ponho paninhos quentes. Assumo-me como membro de uma cadeia alimentar, e como também não levo a mal que pequenos vermes ou parasitas se ocupem de fazer pela vida à custa desta aqui, também não acho um crime horrendo sobreviver à custa de outros seres vivos. Não é excelente, não é ideal, não me desculpo, mas também não perco o sono por isso. 

O que já me faz perder o sono são coisas que, na minha (e sublinho, minha) escala de valores situo mais alto, como uma falta de respeito flagrante que, enquanto espécie inquilina deste ecossistema, o tratamos. E passando só ao tema “bichos”, sim, incomoda-me a displicência com que, em geral, este animal racional trata os demais, só porque estamos no topo da cadeia alimentar. Nem falo de temas quase consensuais como os maus tratos a animais de companhia, mas também a forma como tratamos o nosso alimento, enquanto vivo. 

E é aqui que, entrando pela vertente do timing e estratégia, os vegans perdem imenso. Valerá a pena empunhar a bandeira dos direitos do caracol enquanto a criação de gado e aves se faz nos moldes actuais? Pois. Para um vegan a resposta é afirmativa, nem se esperava outra coisa (é a cena do especismo, aliada ao chatismo), mas, caneco. Não é muito eficaz, em termos de angariar simpatia para o movimento. Isto sou eu, mas se calhar começar a discussão com, por exemplo, e haverá mais, a questão da criação de galinhas em gaiolas, ou o transporte e abate de gado, fosse mais profícua. Uma coisa de cada vez. Passinhos curtos e bem medidos. 

Apelar ao boicote da caracolada enquanto nos supermercados se vendem, a preços de uva incontinente, frangos criados em caixotes, engordados a antibiótico e farinhas proteicas – fabricadas a partir de… carne, uau –, sem verem a luz do dia, empilhados e a pisar os seus dejectos – que se acumulam nas parcas seis/oito semanas de existência destes seres, e só após o seu abate são limpos, para receber nova mole de pintos -, não leva a nada. As pessoas precisam de uma escala, de uma graduação, de partir do mais gravoso para o menos gravoso. As pessoas precisam de um processo. Além de que as pessoas são emocionais, e é mais fácil criar empatia com um ser que cacareja ou alegra as paisagens pastoris que com um ser vil, rasteiro, insidioso, que sai de noite para nos chacinar os lindos, jovens, tenros rebentos de salsa que ainda ontem verdejavam em pura alegria*. 

Tergiverso. Ahém. A cena de ser emocional. Isso. 

Conquistem o omnívoro, não o alienem, não o agridam, não o excluam. Pensar nisso. E sim, se calhar vós até estais num patamar civilizacional superior, mais avançado, vá; admito até que sim senhora, sois dotados de um nível de empatia superior ao meu, e reconheço que isso vos faça sofrer insuportavelmente por todos os bichos, e não vos diminuo ou faço piores por isso. Mas caneco, nem sequer Roma e Pavia se fizeram num dia, tende paciência e, ouso dizer, alguma inteligência, e até empatia para com os bacon-lovers. Afinal existimos todos, temos de nos aturar, e mais vale trabalhar em conjunto que andar a discutir quem são os melhores. É que no entretanto o resto continua, e assim é que não se avança nada. Agradecida.



*se algum vegan se oferecer para ir lá a casa catar os gastrópodes, levá-los e libertá-los em meio livre, correi, que amanhã vou-me a reabastecer de limacide e dar início ao holocausto.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

I've been a bad, bad girl

Fui à amazon alemã pesquisar como tinham traduzido o título da bio-saga do Karl Ove Knausgard, "A Minha Luta". Kudos, alemães. Kudos. Eu também tenho essa estratégia, amiúde.

terça-feira, 2 de junho de 2015

Heaven knows I'm miserable now


Abrindo hostilidades, para quê, insistir num blog? Porquê, dez anos de blogosfera, já indo no quarto espaço? E porque fecho eu os anteriores, convertendo-os integralmente em rascunho, nem sequer fazendo um back-up ou, fazendo-o, já nem me lembrando onde raios o guardei (talvez no entretanto falecido Tó Shiba? Who cares?)
Sei lá. Não, não me apego a endereços web. Já para pôr de parte uns sapatos, o drama, a tragédia. Não, tampouco considero tanto as minhas palavras que sinta necessidade de as guardar. Ou revisitar. Só o cansaço, sinceramente. Ao contrário de Gwendolen Fairfax, se precisar de leitura excitante nunca, nunca me faço acompanhar do meu diário: há melhor. Tudo isto é pó, é ar, é vento e maré. Isto é só uma parte do que sou, essa parte que sai mais por vício (ou hábito) que por querer fazer-se memória. E muda, e muda-se.
Então, assim sendo, porquê escrever esta coisa? Porque sim. Então, assim sendo, porquê ler esta coisa? Boa pergunta, se alguém souber responder acho que vai ficar extraordinariamente decepcionado consigo mesmo.
Mas, como não sou totalmente desprovida de narcisismo, aliás recordo vagamente de ter embalado um frasquinho dele em mil-nove-e-coisa, claro que encontro muitas e boas razões para escrever isto, e para se ler isto.
Onde mais se pode encontrar uma tão vasta panóplia de vacuidades, como sejam o melhor autefite para aquelas férias de sonho no Samouco, ou o casamento ansiado numa tendinha dos arredores?
Onde mais se pode constatar haver seres mais imperfeitos e risíveis que vós, seres que são capazes de andar uma semana a sandes de queijo por pura preguiça (note to self, comprar mais queijo); que passam uma hora a lamentar a sua triste sina antes de se lançarem num (aliás odioso) trabalhinho de quinze minutos; seres capazes de curar as saudades de viagens comprando quilo e meio de barrinhas Hershey’s (havendo melhores chocolates, que há, mas a saudade é esta coisa inefável, e na verdade não há mau chocolate, tal como even a bad pizza is better than no pizza)?
Onde mais poderão ver ventilar odiozinhos, birras, exasperações por pequenos nadas, como as detestáveis marquises, os ridículos condomínios fechados ou pior, os fechados e de luxo, ou pior ainda, os fechados, de luxo, e com a palavra “prestige” associada, ou antes, qualquer coisa com a palavra “prestige” associada? Onde poderão acender tochas e pegar em forquilhas, marchando contra as tuk-tuk, gigantescos autocarros de turistas estacionados ou a fazer inversão de marcha no largo da Sé, selfie sticks (morte, morte, morte!), lojas de recuerdos made in china, o septuagésimo terceiro hotel a abrir portas na Baixa, bandos de xóvens estrangeiros podres de embriagados porque a cerveja deles é refresco e ninguém faz a caridade de lhes augar a super bock, e depois andam a deambular aos gritos, noite fora, também já ali na zona onde repouso e durmo, and so on, so on – e, note-se, ainda nem sequer saí do tema urbano-turístico, dêem-me tempo -?.
Pois, por aqui há de tudo. Não como na farmácia, mais como na Feira da Ladra. Eventualmente, entre a tralha imunda e imprestável, até podem encontrar uma preciosidade. Boa sorte.
Cá estamos. Ou, de forma mais erudita, so it goes.

[A ver como isto corre.]

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Surprise, motherfucker

Que infantilidade de título, eu sei. Começas bem, começas.

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