(ou ainda me cancelam o cartão de feminista, ahém)
Também vimos o Barbie. O filme, não o Klaus (piada muito datada, para pessoas antigas como eu). Fiquei entre o desconsolada (eu nem gosto na boneca, eu era mais Nancy, e estou aqui a ver isto), e o furiosa (ah bom, se isto é o feminismo moderno, milenial, de terceira vaga, estamos bem entregues, sim senhora).
Em resumo, valha-me uma divindade qualquer, não sou esquisita, e assim com'assim também não acredito. Mas gostava porque, no caso, uns raios e coriscos eram bem adequados. Aquilo, pah, aquilo é um desfiar de feminismo palatável, urbano-chic, cor-de-rosinha, vogue, não se aguenta. Ai, as expectativas que caem sobre as mulheres, mas depois a cena "celulite" é running gag. Ai, das mulheres espera-se e exige-se tanto, e se queremos brilhar temos de trabalhar o dobro, mas o "trabalho" da bonecada é tão pueril, tão fofinhoco-superficial, e pior, tão assente num status quo que, no mundo real, não admitimos exista! Sim, a barbielandia é um local assente numa organização social profundamente injusta, de primado de um sexo sobre outro porque (ahém) uma é o brinquedo "oficial" e o outro é o "bengala". Anyone? E a cena de ah, é a boneca que nos faz crer que as mulheres podem ser o que quiserem. Primeiro, não podem. Podem querer ser, mas não podem ser. Porque realidade, não me obriguem a dar exemplos. E deixem-se de merdas, não basta vestir uma boneca de fato macaco (rosa, já agora) para vir dizer que promove a equidade. Balelas.
Anyhoo, já estava enjoada de rosa, e de vacuidade, e fofinhice, e nós rulamos, yay, e somos windas apesar de diferentes (mas celulite, iac, só há uma gorducha, e a esquisita vive à margem, adiante), e eis que entra o Ken. Ok, a representação, tal como a da Barbie, é fidedigna, é aquilo que ele é. E depois lá vão todos para o mundo real, mas não tão divertidamente como noutras fantasias. Spoiler alert, o Ken descobre que (pá, que barrigada de riso) só por ser home pode arrogar-se ser o que quiser, apesar de - óbvio - não ter competência seja para o que for. Mas é macho, e descobre a machitude no mundo real. E leva-a para a Barbielândia, onde reivindica as casinhas cor de rosa (nota, não estou numa cruzada para defender os homens, porque não precisam, mas o facto de o Ken não ter casa é.... esquisito) e machifica os outros Kens. E pronto! Lição social! Os Kens não têm nada na cabeça (lol) mas só porque são homens podem tudo (cansaço). E a Barbie fica muito espantada por a sua influência no mundo real (a cena de promover a mulher, caso já tenham esquecido) não ser tão grande como devia (pah, 'tá mal). Claro que a Barbie volta, não gosta do papel que os Ken chamaram a si, e organizam, as B todas, um golpe para reconquistar o poder, com o plano mais tolinho de sempre, e que resulta porque os Ken são uns cabeças de vento.
Muito cansada. Muito, muito cansada. É que nem sequer terminam num tom positivo de cooperação e equidade entre sexos, nope, a história dá uma volta completa e regressa ao ponto de partida: ninguém aprende, ninguém evolui.
E depois há a coisa de simplificar as partilhas e tomadas de poder, que as m'lheres são inteligentes, a gente ganha, lol. Não. Porque os Ken, além de descobrirem que o man-card dá acesso prioritário a tudo, também aprenderiam, porque o veriam, que um encontrão, um empurrão, um bananão, e ao ar a inteligência. Porque se queremos falar de realidade, falemos disso: a ainda prevalente submissão feminina assenta na repressão que, por sua vez, depende da iminência do exercício da força física, da efetiva, real, sempre presente violência. Não há corderosismo que branqueie isto.
Suspiros.
Na altura achei que era uma cena geracional, o não ter gostado do As Mulherzinhas desta realizadora (enervou-me tanto, mas tanto, dizer-se que era a versão feminista que as mulheres merecem! pá, o livro já é feminista. mas realista, também. e se é preciso explicar, por a+b, o sentido de vida da Amy, então é porque não perceberam nada), mas pelos vistos somos mesmo incompatíveis. Feminismo deste, dispenso.