quarta-feira, 24 de abril de 2024

TV Guia

Posso não servir para mais nada, mas faço recomendações do caraças. E se calhar sou um bocado peneirenta. Mas são boas recomendações! Que são! "Ah, mas é tudo canais a pagar, és peneirenta e elitista!". Pah, em vésperas do 25.04, pah, não vale. Além de que os quatro canais, quando foi a última vez que vos deram uma alegria?, eu já não m'alembro. 

Então, o que é bom e anda aí:

- Ripley (netflix): esta série não é só boa, se eu mandasse era obrigatória. Andrew Scott já foi o melhor Moriarty de sempre, um hot priest do caraças, e tcharam. A Dakota Fanning 'tá crescida. A fotografia é poesia, a história está lindamente contada. 

- Baby Reindeer (netflix, a justificar a mensalidade): uma das melhores série que não quero voltar a ver. É uma autópsia ao trauma puro e duro, e ele há ali bocados (ahééém, episódio 4, ahééém, e não melhora) que ficam a trabalhar. Não conhecia a actriz que interpreta Martha, mas agora quero ver tudo o que ela já fez.

- To Kill a Tiger (novamente netflix, agora já estamos a lucrar): porque já estamos preparados, vamos então continuar no tema, sendo que este é trauma, violência sexual, sociedade, justiça. Agora, na India. Um filme documentário muito bem feito, sensível mas sem paninhos quentes. Revolta muito, mas, ao mesmo tempo, aquece o coração saber que há tanta gente íntegra e boa a fazer trabalho essencial. Comovi.

- Quiet on Set (HBO), ena, agora já entrámos na overdose de abuso e violência sexual, mau trato, e por aí fora. Quando era gaiata via os desenhos animados da Warner Brothers, mas depois veio uma época em que foram banidos, buhu, muito violento, um coelho que é um boneco dar um tiro na cara de um pato (outro boneco) e este ficar com o bico virado para trás. Ou desenhos atirarem bombas (desenhos...), bigornas (também desenhos...) a outros bonecos desenhados. E veio a época da Nickelodeon, que já não me apanhou, pelo que não fazia ideia. Mil vezes o Bugs a escavacar o Daffy. Surreal, aqui é tudo surreal. A forma como era tratado o staff e os putos-actores; o silêncio e conivência dos responsáveis, o porem miúdos a fazer cenas com conteúdo sexual ÓBVIO para qualquer adulto com dois dedos de testa, enfim, e o pior do pior, claro, um ambiente destes é natural que atraia todo o tipo de tarados, principalmente quando quem manda no show é ele próprio um tarado porno-viciado, ressabiado, misógino, a viver a sua power trip. 

E pronto, já é uma listinha boa. Agora vamos acabar o Conan O'Brien Must Go, um excelente limpa palato, e depois logo se vê para onde seguimos.  

Se são daquelas pessoas que têm o Filmin (nada contra, mas tenho de gozar porque mano tem, e uhu, filmes intelequetuais, uhu, olha o menino), passem os olhos por A Zona de Interesse, para ficarem monumentalmente deprês; para acamar, e ainda o apanhando, vejam o Anatomia de uma Queda (já agora, Sandra Huller, não conhecia, mas quero ver tudo o que já fez).

Adeus, adeus, que tenho legos para montar. Viva a liberdade!

segunda-feira, 15 de abril de 2024

Cinco minutos de lamechice

 Sim, reconheço que no mais que aleatório sorteio da doença auto imune me podia ter calhado (substancialmente) pior, mas, ainda assim, acho mal terem enfiado o meu nome na tômbola. 

Ok, não é lupus, nem uma esclerose qualquer (bate na madeira), mas começa por o nome ser muito estúpido e, quando comunicado por escrito, dar azo a mal entendidos: não, mãe, não é uma doença grave, é a doença de Graves. E é tipo ovo kinder: nas entranhas de um chocolate fajuto e muito pouco satisfatório, esconde-se um brinde não menos fajuto e imprestável, que vai ficar lá em casa a ganhar pó e a estorvar e uma pessoa sem coragem para o deitar fora, que era admitir que gastámos numa porcaria nem sabemos porquê, a saber, o hipertiroidismo. 

Resumidamente, não é das piores, mas é muito chatinha. E tem muitos sintomas. A maioria deles, confundíveis com os da peri/menopausa, o que dá uma sobreposição giríssima, hilariante, mesmo. E, se não impedem uma existência normal, perturbam um poucochinho. Ou são mesmo socialmente repreensíveis, como o mood swing que te faz explodir à mínima provocação (Nota: a outra pessoa estar viva, respirar, existir, mastigar, calhar estar ali, pode constituir, para quem padece desta patologia, uma "provocação". Ou um trigger, para sermos modernos.) Ao menos já não tremo das mãos nem tenho uns olhões de marreta, que me davam uma vibe de drógada que ui.

O dia a dia pode resumir-se ao primeiro excitex que é "uai, que sintoma, ou sintomas, me vão calhar na rifa hoje?". Sim, o suspense. Até pode não suceder nenhum, mas, até poisares a cabecita na almofada, não sabes. E então, ainda vais a tempo, com a simpática insónia. 

Enfim, é muito giro. A boa notícia é que, com o acompanhamento certo, podemos ter a sorte de uma remissão. Ali num ano, ano e meio de tratamento. Que implica ir ajustando a dosagem de um comprimidinho canininho, e ver como está a resultar com análises ao sangue cada mês e meio a dois meses (não me pagam a pub, mas na Luz tiram sangue que é uma categoria, e uma recomendação destas, vinda de mim, é para guardar e jurar por ela). Anyhoo, mesmo com remissão, pode sempre voltar. Porque todos precisamos de um certo grau de  inquietação, para nos manter finos. 

O único ponto positivo foi o emagrecer, apesar de ter uma fome devoradora e comer tudo o que me apetecesse. Como disse ao médico, pensei que finalmente estava a ter sorte na vida. Já não, com o tratamento voltou o peso todo e mais algum, de bónus. A fome ficou, exceto nos dias em que alterna com uma náusea, que, atenção, também pode ser existencial. Até porque o pior, e que realmente me tira qualidade de vida, me deita abaixo, já me fez quase não sair da cama quinze dias, estar dois meses para ler um livro, não dar vazão ao trabalho, andar com uma sensação de fracasso iminente, de incapacidade burra e acéfala intermitente, é o cansaço, uma coisa que se abate como uma manta e pesa como a atmosfera de Vénus, um cansaço súbito que é uma exaustão total, um agora estás toda fresca, agora quero deitar-me aqui um bocadinho, faz favor, que me drenaram a energia toda e tenho de esperar para carregar. 

Decidi que não tenho idade para isto, pertantes, vai-se resolver. Vai melhorar. Sou uma paciente muito obediente e cumpro tudo à risca, aponto até na agenda dosagens, análises, tudo. Ando a ler sobre a melhor alimentação (pah, mas o açúcar, a farinha, o glúten agora fazem mal a tudo?, e a minha torradinha com manteiga?, vou comprar à gleba, é? do chocolate já não me queixo porque - juro - enjoei - eu, uma chocaólica tão dedicada - como enjoei do tabaco), a ler sobre vitaminas, a ler sobre o melhor exercício (desespero, o grande motivador). E vai melhorar. Porque não tenho idade para isto, apesar de já ter chegado àquela idade (!!!) das pessoas (mais) velhas. O despautério, não se faz. Rameira da vida, çinçeramente.

quinta-feira, 4 de abril de 2024

Acção de Formação

Agradecia do fundo, fundinho do coração que alguém explicasse às meninas / senhoras que trabalham na Sephora que a táctica de perseguir a cliente até ao esgotamento, insistindo em impingir-lhe um produto que, notoriamente, a cliente não precisava nem queria, pode ter o efeito adverso, ou seja, e no que ao caso interessa, a cliente entrou para comprar uma mixuruquice de um sérum da The Inkey List que não chega aos 15 paus, verdade, mas saiu sem nem isso gastar e, calhando terem-na deixado em paz e sossego, vá, ao terceiro "estou só a ver", a pessoa até tivesse motivação para gastar uns quinze minutos a experimentar e pesquisar outras marcas do pó compacto que precisa de repor, mas não faz mal, mando vir da net o do costume.

[e aqui há quinze dias deixei um piparote de massa na concorrência, porque foram metade chatas do que vocês são. mas, ficando satisfeita com as escolhas, passam a ser "do costume", e manda-se vir de onde, onde? pois.]


quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

Not woke, insomniac

 Hoje em dia não se pode simplesmente 'tar, que és logo acusado de não ser envolvido, ou esquecer o sofrimento de não sei que franja da sociedade. Novidades: o tempo não é elástico, um gajo não consegue ir a todas. Digo mais: desconfio imenso de quem quer ir ou vai a todas. De duas, uma: ou não tem nada com que se ocupar e tornou-se activista profissional (revirar de olhos), ou é um ser acrítico que simplesmente adere a tudo o que está a dar para o seu lado ideológico (duplo revirar de olhos) - porque, a sério, não é fisica, psicológica ou intelectualmente possível - ou honesto - ter uma opinião fundada e informada sobre tudo, mas tudo o que se passa.

É triste, mas dominante: não ter opinião sobre determinado assunto é coisa para pena capital. Não tens opinião, não sabes que determinada questão é problemática, não estás acordado, não estás consciente, e isso, por sua vez é problemático. Estares fora é uma opção, donde, estás a escolher não te interessar, donde, estás a contribuir para a perpetuação do problema, donde, permites a opressão / agressão / exclusão de x/y/z, donde, fazes parte do problema, do sistema, és o sistema. 

O que é problemático, nisto tudo, é a seca que esta forma de estar me dá. Não me acorda mas, admito, contrariada, tem dias que me piora as insónias. O movimento woke está a tornar-me insomne. E cansada. Tão cansada.

As pessoas têm o direito a não ter ou querer não ter opinião sobre determinado assunto. Por diversas razões: ou não sabem; ou não sabem e não querem saber; ou sabem mas não querem saber. Todas são legítimas. Confesso que não tenho opinião formada e informada sobre imensas coisas. Sobre muitas tenho um princípio de opinião, ou seja, tenho certos factos e conclusões como certos, mas não me levam a uma conclusão única, final, e inabalável. Sobre algumas coisas tenho opinião formada, e sobre outras já não quero saber. Mas não partilho estas não, meias e opiniões com toda a gente. Porque não quero, porque não sou parva, e porque sou menina para responder "não tenho conhecimentos que me permitam formar uma opinião" a qualquer pergunta. Sem vergonha. 

Mas se tenho uma opinião, ó meninos, não me venham dizer que é problemática. Sabem o que era problemático, aqui há 50 anos? Ter uma opinião. Defender algo que é contra-corrente (depende sempre do público, mas hoje em dia ninguém diria) não faz de ti um facho, um não-sei-que-fóbico, um opressor, um traumatizador dos oprimidos. [Essa é outra, a obsessão com o trauma, mas fica para outra diatribe.] Dá lugar a discussão. Isso! Opiniões diferentes -> discussão, debate! Mas não, parece que não se pode. No meu caso, porque sou boomer (não sou, em Portugal ninguém é, no rigor dos conceitos, mas para a chavalada parece que isso não interessa nada), e ao querer contrapor, desafiar, rebater, estou a ferir os sentimentos da parte contrária, que se sente atacada, não se sente segura e, portanto, não me deixa completar uma frase sem me interromper com um destes neo-chavões, e acaba definitivamente com a conversa com uma retirada emocional.

E pior que opiniões ou não opiniões, é gostar de alguma coisa que caiu no desagrado dos iluminados acordados. Ó céus, é o degredo. Não se pode. Não pode. E, mesmo não gostando, lá vão eles, todos!, por dever de ofício, ler / assistir / ouvir, para melhor se indignar. Tenho uma teoria: tempo a mais. É um privilégio que não possuo: se um livro, filme, música não me agrada, até posso dar cinco, dez minutos de benefício da dúvida, mas continuando a má opinião, passa a outro. Há melhor em lista de espera, e não tenho tempo para queimar.

Minto, às vezes lá calha ter um tempinho em que a cabeça não dá para mais, e aproveito para acabar o último do Trevor Noah que deixámos a menos de meio, por puro tédio. Me mate desistiu, eu um dia voltei a pegar, e confirmei, triste. Porque já lhe li um livro fantástico, e ri muito com outro stand-up, mas este é tão insípido, tão blah, tão sensaborão. Não ri, zero, nada. Mas atenção: não ofende ninguém, o que lhe mereceu muitos e bons encómios. É, portanto, um espectáculo insípido. Bom para certos palatos, mas eu gosto da minha comédia como não gosto da minha comida: cheia de sabor, extra-temperada. Como a da Taylor Tomlinson, ou da Iliza Shlesinger. Que não ofendem nenhuma espécie protegida, mas têm muita piada.

É claro que há comediantes que considero ofensivos, ainda outro dia aguentámos uns dez minutos de um que não conhecíamos, Matt Rife. Odiámos. Fomos para as redes vociferar, exigir um auto de fé? Não. Parámos e fomos ver outra coisa. Não é o primeiro.

Depois há aqueles de quem gostamos, mas nunca sabemos se vamos continuar a gostar. Acontece, uma pessoa desgosta-se constantemente. E às vezes até vê e consegue dar valor a coisas que desgostam. Um exemplo, eu odiei, com todas as letras, em caps e bold, Succession; aquela gente e estilo de vida dava-me vómitos, queria que morressem todos, mas mortes lentas, dolorosas e sofridas, e vi tudinho. Porque é uma excelente série, muito bem escrita e interpretada. 

E é isso que me custa, que as pessoas não consigam dizer "é bom, reconheço valor, mas não é para mim". Dizem horrores da Gadsby, quando, na verdade, acho que queriam antes dizer aquilo ali. Ou "não consigo entender comé c'uma gaija feia / gôda / lésbica tem mais sucesso que eu, buhuuu". Eu gosto E dou valor. 

E falemos do Gervais: o gajo não está (podre de!) rico por ter roubado ou enganado meio mundo. O produto dele vende, e vende muitíssimo bem, de forma constante, consistente, e há mais de uma década, porque é BOM. Fim de conversa. Não gostam, não comem. Eu odeio sushi, e consigo sempre comer qualquer coisa nos restaurantes japoneses; não faço é uma fita a exigir p'exinho grelhado com arroz de grelos. Idem para Chappelle. Ui, a urticária. Com este fiz um percurso engraçado e muito anti-woke: gostei, deixei de gostar quando estava no auge, continuei a não gostar quando voltou, e voltei a gostar. Pior: adorei o último, The Dreamer. O que é suficiente para me condenar às chamas do inferno woke, o cancelamento total e irrevogável, mas ainda acrescento um agravamento de pena: o Armageddon é melhor, tanto ao vivo (iep, estava lá :P) como na tv (claro que voltámos a ver), embora não seja tão selvagem, digo, bom como anterior Supernature. É ofensivo? Será, sensibilidades há muitas. Ninguém é obrigado a ver. 

Pronto, já forneci todos os argumentos para a acusação. Quem quiser debater, venha, estamos na boa. Se não souber responder digo "não sei"; se não tiver opinião, admito que não a tenho. Essa honestidade ninguém pode negar que tenho. Tomara muitos. Mas sim, os gostos discutem-se. Já não se educam, a menos que se esteja a falar de vossos filhinhos: a esses eduquem como quiserem, [a minha geração tem feito um trabalho do caralho, estão todos de parabéns, sim, é ironia]. Já eu, sou adulta, e não aceito doutrinamentos, ou tentativas de. Fartinha, a ponto de desmaiar de sofrência, de homilias. Ide pregar para uma azinheira, pode ser que vos apareça a Vossa Senhora e faça a caridade de vos levar consigo.  

sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Sim senhora, sim senhora

 Diz ela de mãozinhas atrás das costas, olhando em redor com toda a atenção, tentando micar defeitos na pintura, manchas de humidade. 

Cinco dias de ano novo, dou-lhe cinco em dez, ou seja, tem espaço para crescer. Ou não. A primeira semana não está especialmente famosa, teve um feriado, daí os cinco valores. Mas hummm, não sei. Anteontem fui ao supermercado e já não havia mon chérie. Só um apontamento, hein. 

Lá a ver. Lá a ver.