segunda-feira, 19 de maio de 2025

We don't talk about Bruno


Aqui há quase um ano, ano e picos, deu-me uma comichão do caraças não entender como é que tanta gente que compunha a base de apoio do Trumpas pertencia, precisamente, a uma classe ou grupo social que muito provavelmente seria prejudicado com a sua reeleição - e, na melhor das hipóteses, não tinha ganhado nada com a sua presidência.

Vai daí, decidi lançar-me num deep dive em busca do que pensam essas pessoas, afinal quem melhor para nos explicar os seus quês e porquês. Iniciada a demanda, pus de parte preconceitos do tipo "deploráveis", "red necks", "burros em geral". Queria entender, não confirmar um pretenso julgamento.

E tcharam. Resumidamente, dei cabo do meu algoritmo, ainda hoje o iutubas me recomenda coisas que tenho vergonha de admitir, pronto, vá, vi muita coisa do Da*ly W*re, e foi uma descoberta. Dali saltei para alguns influenciadores com canais próprios, e, entrementes, a título de limpa palato, lá ia vendo uns vídeos de plnatinfluenciadores ou artistinfluenciadores, que é do conteúdo  mais wholesome as fuck que há.

Dizer que aprendi imenso talvez seja exagerado. Principalmente: recolhi muita informação. E percebi as pessoas do outro lado. Para uma esquerdalha moderada cinquentona como eu não é fácil admitir, mas cá vai: não concordo com as soluções propostas (uma ateia pode benzer-se?, é que me benzi muitas vezes); não acompanho a maioria dos diagnósticos feitos, mas tenho de reconhecer, cabeça baixa, braços ao longo das pernas, palmas para dentro: têm razão em muita coisa. Nas queixas, principalmente. A esquerda (e a direita, já agora) moderada abandonou quem dela mais precisa. Tornou-se um bastião de virtude, de bandeiras cada vez maiores, e deixou aqueles conceitos antigos como "classe", "justiça", "mobilidade social", "redistribuição de riqueza", "segurança no emprego", "apoio no infortúnio", "igualdade de oportunidades" (podia estar aqui o dia todo) a ganhar mofo num armário da cave. E depois ainda escarnecem dos que precisam dessa esquerda/centro/direita democrática, tratando-os como burrinhos sem discernimento. Admiram-se? Eu já não.

Em agosto não tinha dúvidas de que o Trumpas ia ganhar, e achei muita graça à kamaleuforia. Graça no sentido fado tuga, ai, que agora estás tan féliiiz, mas logo te desgraças.

Em setembro disse a uma eminência parda do partido que arranjassem maneira de se livrar do PNS*, e depressinha, ou acabavam irrelevantes, como aliás (eu achava que) já eram. Ninguém liga à Izzie, ninguém tufona à Izzie a pruguntar como deve fazer, e depois ó.

Donde, se os 50 na assembleia me chocaram, porque ainda não sou uma velha cínica, infelizmente não me surpreenderam. É hora de se fazer uma grande reflexão, e não só internamente. Avançamos por tempos perigosamente interessantes, daqueles que acontecem quando os centrões democráticos esquecem as suas bases (o povo, 'tá a ver?).

Não vou dizer mais nada, que odeio ter razão nas piores atoardas que venho mandando. Quero enganar-me desta vez, se faz favor. 

E não chamem burros aos eleitores. Façam esse favor. Tentem sim perceber de onde vêm e para onde querem ir. E depois conversem.


*não disse PNS, disse taberneiro, mas de uma taberna boho-chique cheia de conceito, com pratos, copos e talheres  desirmanados, e onde a comida é uma merda.


2 comentários:

  1. E a presuncao de tanto europeu (portugueses ate mais que ingleses) "So aquela cambada de burros americanos elegiam o Trump, e pela segunda vez"... e agora elegeram 60 do chega... 60! 2 mais que o PS, para a assembleia portuguesa. Lindo

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  2. Nem me digas nada, esperava que ganhassem mais um ou dois deputados, mas esta razia... Até ando com tonturas. Estou muito preocupada, e sem esperança.
    Mas a (nossa) esquerda não aprende. O Bloco quase extinto, e bloquistas queixam-se nas redes sociais que o Livre os "roubou". Zero responsabilidade pela campanha miserável, e aquela ideia cretina de voltar a congelar rendas.
    O PS, bom, foi o choque, mas o PNS leva a taça deste desastre. Geriu muito mal a questão da comissão parlamentar de inquérito, é um tasqueiro beto, parece que anda ali para encher os tempos mortos. E o PCP, pois, vão morrendo os mais velhos e os novos não os vejo a ter uma ideia.

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