quinta-feira, 12 de março de 2020

Do the Right Thing (2)



Estou oficialmente liberada para teletrabalhar. Na verdade já podia, mas não todos ou quase todos os dias, e além disso odeio teletrabalhar. Se é para sofrer, que não seja em casa, dá muito mau ambiente ao nosso sagrado refúgio.
Mas mais que poder, tem de ser. E vai ser. Silver linings: tenho muito furo para abrir em paredes, pode ser que agora vá. E há chocolate.
Os meus sobrinhos continuam a ter aulas (aaarrrrghhh!, e não digo mais nada), mas na eventualidade de serem fechadas as respectivas escolas estou disponível para coordenadora de ATL de um adolescente e um pré. Andar na rua é que nem pensar, ficam a aturar a chata da tia, a ver um filme, a receber uma formaçãozinha em bricolage, jardinagem, passar o chão a pano, super a favor de trabalho infantil familiar. Induca.
Me mate, assalariado de uma empresa hipercapitalista e, nem por acaso, bastante rentável, que nem se dignou a forjar um plano de contingência a não ser para os top-chefes, que presta zero informação aos trabalhadores além de uns lamirés no mínimo insultuosos, tal é a falta de respeito pela sua saúde e bem-estar de quem ali trabalha, nem falando dos fregueses com quem contactam, continua a laborar fora. Vai ter serviço de transporte porta a porta por uber-eu, apesar dos seus protestos, porque somos uma família e tem quatro felinos para criar.
Falando de felinos, temos quinze quilos de ração e trinta de areia, acho que sobrevivemos todos.

Se alguém, porventura, acha isto alarmista ou palerma, ponderai que alguém pode ter um pai com mais de 75 anos, diabético, com insuficiência cardíaca e respiratória, e que, azar dos Távoras, está neste preciso momento internado com uma pneumonia. É por essas e tantas outras pessoas vulneráveis que o fazemos. A umas conhecemos os nomes e temos afectos, a outras não mas isso não interessa nada. Somos todos por todos.

E por amor da santinha, ou acabam com o fetiche de acumular papel higiénico ou me explicam o racional da coisa, porque, que eu saiba, a epal não vai cortar fornecimento, vamos todos sobreviver, e limpinhos.

8 comentários:

  1. Tugas being tugas... Tu nem imaginas a contrainformação que circula aqui na parvónia. Fui ao supermercado durante a hora de almoço e parecia fim de semana de final de mês: carros cheios a deitar por fora, prateleiras vazias, filas até mais não. Ontem no grupo de WhatsApp dos pais da turma do mais velho já havia alguém a dizer que iam buscar o filho porque alguém lhes tinha dito, que alguém disse, que lhe disseram de fonte seguríssima que já havia uma criança infectada na escola. Vou buscar o meu filho ao fim do dia, como de costume, e a primeira coisa que ele me diz é: vamos morrer? Oh pá a sério?! Sim, vamos todos tentar conter a coisa, socializar menos e tal, mas sem alarmismos, por favor! Quanto às crianças não irem às aulas, para mim era como em Macau: se é para parar, pára tudo e pronto.

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  2. Olá a ambas as duas :) estou também em teletrabalhar, mais o pai da criança e a criança e a gata, está a ser um must. aqui no meu burgo só vejo lojas abertas, acho que o estado de emergência não chegou ao subúrbio. Izzie, espero que o teu pai esteja melhor!
    :*

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  3. É isso e comprar armas para defender o stoxk de papel higiénico! As melhoras do teu pai e que isto passe depressa.

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  4. Obrigada de coração pelos votos de melhoras, mas o meu pai não resistiu.

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  5. O meu morreu ha 4 anos e a minha vida mudou completamente. Nem tudo para mau, muita coisa boa aconteceu que se calhar não teria acontecido se não tivesse um choque no sistema.

    As circunstâncias são diferentes. O meu pai era mais novo, uma pessoa muito popular na comunidade, eu vivo longe, a morte foi repentina, etc. Mas luto é sempre luto. Os primeiros tempos entrei em piloto automático de "make it work" e parecia super forte e tal. 6 meses depois estava com uma depressão terrivel. Senti que tinha ultrapassado o sofrimento 2 anos depois dele morrer. Recomecei a viver por mim e a (re)encontrar alegria das coisas.

    Um abraço muito apertado. Fala no assunto se te ajudar, principalmente com a família, que todos estão a sofrer e podem magoar-se uns aos outros sem querer.

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    1. As circunstâncias são sempre diferentes, mas a dor é sempre uma constante. O meu pai foi caindo durante ano e meio, de início tinhamos esperança que fosse reversível, mas de há seis meses a esta parte tornou-se patente que não. Até ele já não dizia "quando estiver bom", "quando me curar vamos todos almoçar".
      Sinto muito a sua falta. Tive uma semana muito má, estou a gerir como posso, tenho receio que também um dia me caia em cima com muita violência e me vá abaixo a sério. O afastamento da família por causa desta pandemia não ajuda.
      Um grande, grande abraço.

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    2. Já tinha vindo cá responder mas o tlm apagou-me.

      Não tenhas receio do que aí vem. Vive todos os sentimentos sem culpa e não receies o que vier, porque bom ou mau, é um passo em frente para ultrapassar o luto. Vai falando sempre, une-te à tua família que amas, aqueles que são bons para ti mesmo, aqueles que te confortam....eles tb estão a sofrer e não te vão confortar muito agora, mas precisam falar para ultrapassar e estabelecer um novo equilíbrio, uma nova.hierarquia, um novo papel. Há situações que vão desmoronar e outras que se vão criar.
      Por ex não sei se o teu pai ainda era o chefe de família, a pessoa mais dominante a quem os outros recorrem para apoio ou conselho. O meu era. E com o tempo os diversos papéis dele dentro da família, no ciclo de amigos, na comunidade, foram sendo absorvidos por outros membros... e este evoluir demora o seu tempo, dói muito a quem tb se calhar tb queria ter um protagonismo/papel que outro alcança. Estabelecer esta nova hierarquia que funcione para todos é um processo de avanços e recuos e muitos amuos tb, mas é preciso ir falando, especialmente com a família que mais amas, por muito que doa às vezes, porque é no diálogo que há tb limpeza do ar e aproximação.

      Abraço, não tenhas medos dos sentimentos, vive um de cada vez e acredita que um dia vais mesmo ser feliz de novo. Parece impossível, parece cliché, mas acontece.

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    3. Obrigada pelas tuas palavras, pelo teu carinho. A sério :)

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