segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

O mundo pula mas nem por isso avança

Uma livraria qualquer não interessa onde, nós às novidades, e acabamos distraídos com uma menina pucanina, que anda por ali a cirandar cantando baixinho e volteando em conformidade. Mêmo gira, a miúda, pá, os cínicos de sorrisinho besta.
Sucede nós estarmos junto à secção infantil ao mesmo tempo que dita menina - não, não somos stalkers tenebrosos, gostamos de livros para miúdos e há sobrinhos, também, isso, a desculpa são os sobrinhos. A pucanita está a tentar convencer a mãe, com toda a urgência guinchante dos seus argumentos, a levar determinado livro. A mãe diz que já têm, e ela levanta o de cima, mostrando outro da mesma colecção. E a mãe: não, esse é um livro de piratas, é para meninos, e tu és princesa, não cito de cor mas foi isto. A menina começa a chorar e mãe leva-a rapidamente.
E nós de boca aberta, a olhar um para o outro, opá, opá, opá. Mate resmunga que a menina lê o que quiser, ora (asneira gorda), e eu, que não contesto a decisão de comprar ou não o livro, entristeci-me com a justificação.
Tanto mummyblog, tanto workshop para mamãs, e ainda ninguém as ensinou que sim, são todas princesas, mas há princesas-pirata, princesas-mosqueteiro, princesas-aviador, princesas-explorador, tanto como há princesas-bailarina, princesas-princesa, ou princesas-fadinha?
Ca porra de vida, sinceramente, é isto 2017, deixem as miúdas ler e ser o que quiserem em paz.

33 comentários:

  1. pois eu cá acho muito bem. isso da miúda começar cedo a dar-se conta da diversidade do mundo, e depois ainda acabar a compreender os problemas existenciais dos piratas, a não marginalizar a perna de pau o olho de vidro e a cara de mau, nã, é melhor prevenir que remediar. podia acontecer a garota acabar numa princesa do povo, e ninguém está para andar a educar uma aristocrata capaz de descer à plebe e ao submundo. basta ver o jack sparrow e a miúda que saltou da mansão para o navio da bandeira negra, pérola, é certo... mas...
    boa semana, Izzie.

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    1. Sim, é melhor que seja uma princesa bela, recatada e do lar... cá agora andar aí em aventuras, toda despenteada :D
      Boa semana!

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  2. Mamãs e papás, não é? Eles também contribuem para a perpetuação dos estereótipos. Digo isto porque caímos muito nessa força de expressão.
    Até nas reuniões de pais, as professoras dizem quase sempre "as mães isto e aquilo" e aqui o grilo falante acrescenta "e os pais!"
    Paula

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    1. Paula, isso mesmo, é a mãe E o pai. A menos que não haja pai na fita... E também pode ser só o pai. Ou os pais, as mães. Os tempos mudaram, caramba.

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  3. Com muita tristeza minha ouvi de uma priminha de 6 anos que livros de monstros são para meninos. No final gostou da história, que é sobre um monstro, sim, mas principalmente sobre emoções, muito gira. Muito pulo para dar, precisamos urgentemente de trampolins!

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    1. Goldfish, os monstros são para todos, incluindo adultos. Ora que coisa, essas diferenciações são destituídas de sentido e... parvas.

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  4. Uma famosa Blogger da nossa praça acabou agora de falar em posições extremas do feminismo. Quando se lê isto, como ficar espantada com essa mãe?

    No face do Nuno Markl, está tudo a agradecer a Deus o facto de o filme do Batman estar a vender mais do que as Sombras nos EUA (ignorante que 90% dos lucros do primeiro filme vieram do mercado europeu e australiano), não por serem cinéfilos, mas porque estão muito histéricos porque há um filme que apela à masturbação feminina.

    Foda-se, às vezes a pessoa considera que campos de reeducação eram uma boa ideia.

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    1. Essa não li. A única posição mais extrema do feminismo que não acompanho é aquela que postula que mulheres são superiores a homens, mas nem considero isso feminismo: feminismo é igualdade (de oportunidades, de tratamento, de direitos).
      Já quanto às Sombras, não sou fã, aborreci-me de morte no primeiro filme e não vi todo, mas cada uma diverte-se como quer, ora.

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  5. (E livros para miúdos são lindos, mas até nas capas se vê a discriminação).

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    1. Verdade: há livros que até se anunciam especificamente para meninas ou meninos, e com capas rosa ou azul. bof

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    2. A Blogger nem sequer falou nisso. É só uma forma cobarde de se demarcar e, ao mesmo tempo, de fingir que está na crista da onda.

      Já se vão vendo capas neutras (e lindas), mas quando chega aos livros para adolescentes...ui.

      Mesmo os livreiros, sendo gentis, acabam por cair um pouco nessa armadilha. Fui à Bertrand do Chiado e pedi um livro para uma criança na segunda classe e perguntaram-me logo se era menino ou menina. Precisei de uma hora para encontrar um livro interessante, sem uma capa parva, cuja protagonista fosse uma menina. Também levei um livro de recortes de bailarinas (lindo, lindo) porque tanto a mãe como a menina gostam de ballet.

      Quando fui pagar, insistiram se era para a mesma pessoa :/.

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    3. Sim, muitas vezes, além da idade perguntam o sexo da criança... E caramba, se antes da idade escolar isso se esbate, em crianças mais crescidas é complicado, há muita divisão de temas por sexo.

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  6. estava a começar a acreditar que já não se fazia disso. agora começou a dar o revolução de género na NG, é interessante, suponho que levaria essas mães de princesas para a beira de um ataque de nervos.

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    1. Fuschia, hoje em dia temos todos de ter uma perspectiva e abordagem mais abrangente, no que respeita a questões de género. Sabendo-se o que se sabe nesta época, é um dever, e basta estar informado.
      Durante o meu crescimento nunca tive dúvidas de identificação de género, mas fui muitas vezes qualificada como maria-rapaz, o que me chateava sobremaneira. Eu era uma princesa mosqueteira, ora. E detective ;) Menina, mas gostava do que gostava.

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  7. Detesto esta mania dos princípes e princesas. Irrita-me tanto.

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    1. Confesso que não me irrita se não vier acompanhada de mais diferenciações que excluam gostos naturais das crianças. Um rapaz pode adorar cozinhar ou dançar, e não deixa de ser um príncipe. A menos que não tenha identificação de género masculino, aí é o que ele quiser ;)

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    2. Também eu detesto esta mania de dizer às crianças que são princípes e das princesas. Como se ser um menino ou uma menina igual aos outros meninos e meninas fosse coisa pouca!

      (Bem sei que as meninas que nascem num bairro de lata não terão nunca as mesmas oportunidades do que as filhas do rei de Espanha mas gosto de pensar que, apesar daquelas serem princesas, não são na sua essência diferentes das primeiras.)

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    3. Teresa, é verdade, não é coisa pouca :) Mas eu acho que todas as crianças são, de alguma forma, príncipes e princesas. Todas mesmo.

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  8. (rebolando os olhos)
    Com os meninos os limites são ainda mais rígidos. Ainda me lembro quando, numa dada altura, comprei um conjunto de fogão de cozinha e uns tachos de brincar, porque o miúdo só falava em cozinhar e inventar comidas e ia sendo fuzilada pelo meu gajo. De lá para cá, fico contente por ver que pelo menos ele já vê as coisas de maneira diferente. Mas, basta ver a disposição dos brinquedos nos hipermercados para perceber que existe ainda um longo caminho a percorrer.

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    1. Anna, eu sou super a favor do trabalho infantil, e como os putos são uns macaquinhos de imitação, até é boa ideia dar-lhes tarefas, sempre adiantam serviço :D E mesmo sendo rapaz continua a precisar de comer e ter roupa lavada, ora.

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    2. É verdade, se já há algum esforço em alargar horizontes às meninas, aos meninos é mais difícil - mesmo não havendo oposição do pai há dos avôs. Eu que o diga, que tenho um filho com 3 avôs e um bisavô (ainda assim, se calhar, é o menos sexista quanto aos brinquedos)

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    3. Goldfish, aqui a feminista acha que o feminismo também tem que "libertar" os meninos. Igualdade é isso, é alargar os horizontes para ambos os lados, para que nenhum dos sexos tenha vergonha nos seus gostos, e contacte com um leque alargado de actividades e opções.

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  9. Mesmo achando uma parvoíce, até compreendo que haja brinquedos mais adequados a um género que a outro (depois há os gaiatos que fogem ao mais comum). Mas livros? Sempre achei que os livros era absolutamente neutros. Enfim.

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    1. Patrícia, também acho que os livros deviam ser neutros, mas pronto, o preconceito tem muita força. Ainda :/

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    2. Discordo da patricia - que brinquedos sao esses apropriados para generos? O meu priminho adora brincar com a cozinha dele (gosta tanto que ja vai na Terceira cozinha diferente, e agora pediu um aspirador, e e' ele que faz os penteados 'a irma) e a minha sobrinha ja e' mais puzzles e coisas telecomandadas. Se nao for preciso a pilinha para brincar com eles, nao entendo porque ha brinquedos apropriados para genero.

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  10. há dias, numa loja de brinquedos, vi uma mãe responder à filha (de 5/6 anos) que tinha escolhido a fantasia do homem-aranha: Já sabes, se levares essa, não tens mais presentes até ao fim do ano! Já sabes que a mãe não gosta da tua escolha! Não te compro mais nada até ao final do ano, não te esqueças!
    tive vontade de bater na mãe, muito. a sério.

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    1. Flor, coitadinha da menina, pá! Não se faz, caramba, que maldade. Aqui há uns dois ou três anos vi uma gaiata que não teria mais de oito anos vestida com uma fantasia de homem-aranha - com chumaços a fazer de músculos e tudo, nitidamente destinada a rapazes - e que gira, feliz e adorável ela estava, aos pulinhos rua fora. Estava uma mulher-aranha supimpa.

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  11. E põe nem avança nisso. Trabalho com jovens mães que nao gostam quando os seus filhos rapazes querem brincar com "bebés chorões", as mesmas que passam a vida a dizer que os seus companheiros não querem participar nas rotinas parentais.

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    1. Manuela, caneco, qual o mal de uma criança, seja ela qual for, brincar com chorões? Até acho bastante normal, no fundo estão a imitar os adultos e a relação com bebés. Não entendo essa mentalidade , não entendo.

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  12. Não são todas felizmente. Estou sempre a dizer que não há brinquedos de meninos ou meninas, nem cores destinadas a géneros, mas nem sempre é fácil. Brincar é experiênciar a realidade e é bom brincarem com bebés, carrinhos, dinossauros ou cozinhas, quer sejam meninos ou meninas. Eu estou sempre a incentivar que isso aconteça e que as mães com quem trabalho tambem estimulem isso . Achava que estas novas gerações seriam diferentes para melhor, mas no meu dia a dia de trabalho com adolescentes vejo o contrário. Muito ainda continua igual relativamente a preconceitos, especialmente discriminação de género ou orientação sexual. Aquilo que as nossas crianças e adolescentes acham certo ou errado e que admitem que continue a acontecer a si ao aos outros por vezes é assustador. Algo de muito errado continuamos a fazer, porque os miúdos são o resultado daquilo que nós adultos fazemos. Depois lembro-me que existe um trump no poder e que alguém deve ter votado nele, certo?

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  13. Triste. A mae ate podia estar sem dinheiro e ter sido a primeira desculpa que lhe veio 'a mente, mas mesmo que o motive fosse financeiro, tenho pena do sexismo da desculpa. A miuda vai crescer neste ambiente sexista.

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    1. Pois, AEnima, se a questão era dinheiro, ou já ter muitos livros, ou outra, mais valia explicar.

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