sexta-feira, 21 de maio de 2021

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As coisas devem estar a voltar ao tal "normal", que hoje vi e ouvi uma senhora descompor o caixa pela demora. De mão na anca, cara feia, exigia saber o que se passava e porque estava a demorar tanto, a saber, o despachar da cliente lá da frente. Que deviam abrir outra caixa, ooooohhhh, temos potencial gerente de loja, alguém ofereça o cargo à senhora. 

Já não via uma cena destas há muito tempo. Se calhar tenho andado distraída, saio pouco, ou simplesmente tenho tido sorte. Provavelmente confundi a relativa paz nas interacções com uma espécie de prevalência de bem querer e bem fazer, derivada, sei lá, da tribulação dos últimos tempos. Na qual nunca acreditei, note-se. Ainda assim, benefício da dúvida, blablablá. Mas não, não vamos sair disto melhores. Não dou um ano para andar tudo (outra vez) à compita pelo título do ser mais malcriado e desagradável.

Dito isto, e pessoalmente, já me vai faltando a pachorra para disputas. A menos que receba por isso, ou seja, a menos que seja em ambiente laboral e no estritamente necessário ao desempenho das minhas funções. As outras, vade retro. Fico só a assistir, a uma distância confortável, comendo o meu cornetto de chocolate (não aprecio pipocas). Zero disponibilidade para intervir, reivindicar, explicar, sequer apaziguar. Como se diz mais lá para cima, fodeibos, a vida já se faz curta e demasado imprevisível para me meter em salsadas.

A menos que seja uma coisa que mereça mesmo a pena. Palavra de quem já se viu assim de apanhar uma sova de um hooligan bêbado a quem fez frente, ou ser apoucada com muita soberba e acrimónia (quem me manda sair de casa de jeans, techérte e converse, tira toda a credibilidade a uma pessoa) por um casal de boomers-betos a quem dei um lamiré seguido de um francamente, que vergonha, porque estacionaram num lugar reservado. Se fosse hoje, às tantas, cornetto. De resto, passem lá à frente, não digam bom dia, se faz favor ou obrigado, a ver se me ralo. Chamem-se nomes nas redes sociais, defendam o absurdo, advoguem o maltrato ou destrato, quero lá saber, não me meto, não falo. Nem tomo iniciativa de levantar certos temas, note-se. Não tenho tempo nem vocação para me dedicar ao ensino especial de adultos, e a idade vem-me consumindo a pouca paciência de que dispunha. Donde: não, not, nope, acabou o activismo, ao menos em plataformas públicas, redes sociais em geral, e este blog em particular. 

Pode ser é que me apanhe(m) num dia mau, e aí não prometo nada.   


8 comentários:

  1. Queria tanto estar a esse nível. eu falo, tento educar (pode parecer arrogante, mas tento pelo bem, juro), tento abrir a cabeça a pessoas limitadas, revolto-me, indigno-me, tomo como minhas as dores dos outros e por norma, só me canso, magoo-me, tendo a achar as pessoas cada vez mais burras e mais estúpidas e mais cruéis e menos empáticas e pronto. mas ainda não desisti :(

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    1. Espiral e Manuela, gabo-vos a insistência, a sério. Em muitas situações ainda não consigo ter a atitude (que acho) mais sensata, que é deixá-los a dalar sozinhos. Mas cansei. Já achei que o diálogo era a solução, que muitos dos preconceitos advêm da falta de informação, mas para que resulte é preciso que do outro lado haja elasticidade mental e capacidade de pensar, de mudar de ideias. Em discussões que já tive com anti-vaxxers (uma delas também fanática da pseudo ciência alimentar) e pessoas de extrema direita (mas mesmo extrema, daquelas anti imigrantes, anti refugiados, racistas, xenófobos, etc) só consegui ficar agastada e cansada.

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    2. Afinal dei conta agora que com os de extrema-direita já não insisto. Discutir ideias com alguém assim para inglório dá-me tamanha irritação que chega a ser física! Nem os consigo ouvir. Transformo-me em alguém que não gosto! Pior é que estão cada vez mais desinibidos e por todo o lado e por isso mesmo deveria haver quem pudesse por termina isso. Eu que sou toda pró liberdade de expressão com essa espécie penso que não deveria existir, porque se fossem eles a mandar de certeza que não haveria.

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  2. O Covid fez me perder talvez uns trinta "amigos" facebookianos(oh que tristeza, chorando horrores, só que não) entre eles primos direitos e afilhados. Bárdamerda, negacionistas, adoradores de deuses vingativos e saudosistas de Salazar, são todos desamigados sem explicação, e nem sequer me dou ao trabalho de os bloquear

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    1. R, devo ser muito abençoada, porque não conheço nenhum negacionista. Também o meu facebook é muito limitado, só uma dúzia de pessoas próximas e mais nada. Mas faria o mesmo, não há pachorra. E para os do antigamente é que havia respeito e era bom, idem aspas.

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  3. Estou na fase intermedia. Naquela em que ainda acho que e' o meu dever civico falar para proteger os desfavorecidos (e cada vez me lembro mais disto com o crescer do nacionalismo, fascismo, e desigualdade), ou nao me chatear.

    Sabes, noto muito isso em Portugal. Chego a Portugal agora e reparo como a vida ai e' muito mais stressante. Sao as senhas para tudo, senao o pessoal arranca olhos a debater lugar na fila. E' o road rage no trafico, a competir com os carros 'a volta para avancar 10 metros mais. E' no supermercado, quando notas com a mulher atras de ti a acelerar o passo so para se por 'a tua frente na fila da caixa. E' esta constante necessidade de legislar regras de conduta, quem tem prioridade, onde se pode estacionar, etc, simplesmente porque nao ha civismo, e nao podemos deixar que os individuos distribuam recursos escassos de forma justa.

    Eu quando estou sozinha, sem filhos, posso andar bem e desimpedida, estaciono longe da porta onde quero ir (super, shopping, etc), para facilitar a vida a pessoas mais velhotas, ou com dificuldades, ou maes que vem com putos pequenos, para que tenham lugares livres mais perto. Mas em Portugal nao. O pensamento e': nem tenho os filhos comigo, mas tenho as cadeiras no carro, posso estacionar nos lugares de familia que ninguem me apanha. E' esta cultura da chico-esperteza, de sacagem, de total desrespeito pelo proximo que me faz ver que, para alem dos indicadores economicos de desenvolvimento, ainda estamos a anos luz de evolucao civica e cultural de um pais no norte da Europa.

    Admito que nao sei que faca. E' pro que acordo no dia.

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    1. AEnima, eu separo duas situações: discutir/debater com fachos, negacionistas, anti-vaxxers, homofóbicos, racistas, xenófobos, não, mil vezes não. A não ser que me dê uma travadinha. Assistir a situações em que alguém é violento ou humilha outrem, é diferente. Pede intervenção, mas já penso mais em que tipo de intervenção: confrontar o agressor não adianta, e até pode ser perigoso; apoiar o alvo, isso sim.
      A falta de civismo mexe-me com os nervos. Infelizmente é bem verdade que muita gente aproveita os lugares de estacionamento para famílias só porque tem cadeirinhas no carro. Passar à frente até parece que dá estatuto, não pagar impostos idem. Quem cumpre as regras é tratado como parvo. Entristece-me brutalmente.

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