segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Então vamos lá a isso, tudo de mãozinhas no ar para um belo momento de comiseraçãozinha

 *esqueci de especificar: é um momento de auto-comiseraçãozinha 



Caso alguém ainda tenha curiosidade (já sei, não têm), e pergunte (ok, ok, não perguntam) "ó Izzie, filha, donde andaste tu, que fizeste quatro meses e picos tão caladinha", eu respondo (pronto, ninguém quer saber, mas isso nunca me deteve), com toda a verdade!, toda a çinçeridade!, toda a acutilância que me caracterizam (tenham paciência, façam-me a vontade e finjam que acreditam).

A deprimir. A chorar. A desesperançar.

É. Sou uma pessoa muito em cima, uma companhia muito boa, a alegria da festa (nota: não há festa).

Em jeito de resumo autobiográfico, sou uma deprimida crónica, (ou, tivesse nascido rica, desocupada e no século XIX, uma melancólica inveterada, prefiro esta versão). É um facto, já me habituei a lidar com ele (30 anos de experiência, não vem no CV, não serve para nada, mas pronto), tomo a minha dose química de sobrevivência e cá vamos andando.  

Sucede, porém, que até o mais atento e experiente deprimido pode cair ainda mais um bocadinho. E, como experiência nem sempre equivale a competência, o deprimido crónico ignora os sinais, anima-se com o eterno "é só uma fase", seguido do sucesso "isto passa". Mas não passa. Uns dias piora, outros não piora. Mas não melhora. 

E segue a requentada rotina: tristeza permanente, choradeira persistente. À menor provocação. Por norma despachava a situação logo de manhã, depois do banho, que nisto (só nisto) sou muito organizada: despacha-se a deprimência logo de manhã, que é quando começa o dia. Da choradeira ficava arrumada; mas já a tristeza, a sensação de desamparo, desconsolo, a anomia, carregava-as todo o dia. Ainda assim, persistia em encontrar causas - que as havia, e há - e soluções, népia, adiava. Porque. Vai. Passar. Só. Porque. Sim. Caso vos tenham enfiado a balela, fica aqui a voz amiga: pensamento positivo não é solução. Principalmente quando o nosso cérebro não o consegue gerar, e faz uma fita do caraças quando o tentamos forçar.

Depois há o dia em que uma pessoa  tem um lampejo, assume, e procura ajuda, sem reservas. Marca a consulta, não disfarça, chora ali toda a baba e ranho que vem acumulando, e sai com a receita reforçada. E resulta. Há quem tenha um nojo muito específico a esta solução, "ah, estás a encher-te de químicos", e depois? Química está em tudo. Nós somos química, é aqui que está a receita de como funcionamos, pior ou melhor. Química é a sopa que é o nosso cérebro. Um bocadinho de sal a menos ou a mais pode estragar ou consertar. Há que abraçar a química. Dar valor à química. Achei que era oportuno lembrar, diz que hoje é o dia mundial da saúde mental. Afinem a vossa receita de sopa, se não vos souber bem. Vale a pena. Mesmo.

15 comentários:

  1. Química aqui! Vou na quarta depressão, agora com burnout. Estou perdida, merdosa, arrasto-me. Vivam as drogas!

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    1. Sãozinha, que grande porra, lamento. Infelizmente, calculo o que estejas a passar (tive uma valente aos 19, e desde então tive umas recaídas, mas consigo manter uns bons anos de estabilização pelo meio.) Burnout era diagnóstico que ainda não se usava quando tenho a certeza que tive um. Só me faltava babar, a cabeça não funcionava, sentia-me burra o que só agravava a depressão, e aquela sensação que nunca mais ia conseguir sair do buraco... horrível. Mas melhora. É a única coisa que posso dizer, para animar. Pode levar mais ou menos tempo, leva o tempo que for preciso, mas há-de melhorar. Acredita nisso, sê gentil contigo, e dá-te tempo.
      Um grande abraço, e estou aqui para o que for preciso :)

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    2. <3 Estou a tentar não meter baixa, mas não está fácil.

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    3. Sãozinha, ia ralhar por estares a trabalhar nessas condições, mas depois lembrei-me daquela sujeita que no ano passado, por esta altura, andava a miar que não sabia se aguentava até ao Natal, e daí até agora, nenhuma baixa, e achei que não tenho moral. Mas pronto, não te rebentes, tá? Não somos super. Nem temos o dever de ser <3

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  2. Parabéns! Encontraste um que te ajuda. Eu ainda não. Já abracei a química há anos, mas vão perdendo o efeito comigo e outros efeitos secundários superam. Neste momento já passei todos, o médico não sabe que mais pode receitar, portanto passou-me para outro mais especialista. A ver vamos. Também ando há meses, para não dizer anos, que sair da cama é uma luta diária.

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    1. AEnima, felizmente dou-me bem com a venlafaxina (cá comercializada como Effexor) há muitos anos, pelo que aumentar a dose, ainda que por períodos curtos (curtos é como quem diz, entre 4 a 6 meses, mínimo) é suficiente. Mas também já tomei cenas que deixavam de fazer efeito, se calhar por habituação, e é terrível.
      Me mate tem uma excelente psi que finalmente acertou numa combinação que está a resultar muito bem (ele também sofre de depressão, mas diferente da minha, e com outras situações conexas, enfim, não há duas pessoas iguais). Levou o seu tempo, infelizmente só lá se chega por tentativa e erro. Digo-te o que lhe dizia e lhe digo: não desistas, um dia vais acertar. Temos de acreditar nisso, ou forçar-nos a acreditar. É uma longa e difícil caminhada, eu sei, e lamento que tenhas de passar por isso.
      Um abraço gigante, e eu cá estou :)

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    2. Effexor eh vida ! Finalmente emcontrei alguma paz. Vivam os químicos ♥️

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    3. É sim senhora :D Comecei a tomar quando apareceu, na altura custava uma pipa de massa, acho que uns €40. E o bom que é ter efeito prolongado, que diminui a dose necessária. O que tomava antes era uma bomba, deixava-me meia zonza

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    4. Também já fui cliente Effexor e Escitalopram, funcionam ambos bem. Agora estou a dar na agomelatina, é mais fraco, mas acho que vou ter de mudar para as drogas duras não tarda.

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    5. Nao tenho a certeza se ja experimentei venlafaxine, e' do grupo de SSNRIs e desses experiementei uns quantos que me dao muito sono, muito sono. Fico zombie durante o dia. Passa-me a ansiedade toda, mas a depre/low mood, nem por isso, por ando apatica o dia todo e durmo em cada cantinho que posso. Escitalopram ou ate o citalopram (2 componentes activos, escitalopram tem so 1, da menos efeitos secundarios, mas tb tem menos efeito em mim) e' um SSRI, e dos que me da melhor efeito. A maioria dos SSRIs dao-me dores de cabeca horriveis, e o citalopram so me da nos primeiros dias. O problema e' que o uso continuado causa 2 efeitos muito: 1) o efeito na ansiedade nao e' muito, e vai acumulando, portanto passado uns meses estou electrica e muito muito muito stressada e 2) aumenta o QT interval no coracao, que provaca doencas cardiacas graves, e ja ha evidencia que quem toma citalopram mais de 3 anos tem risco agravado de ataque cardiaco, e outros problemas. E problemas desses ja tenho eu que chegue na genetica herdada da familia, portanto chegou ali aos 2 anos continuados de uso e disse que nao queria mais (se juntar os anos todos de uso ao longo da vida ja vai prai para 5). De modo que agora ando na vortioxetina, que e' uma categoria nova de anti-depressivo e que sinceramente pouco ou nada me faz. Estou na dose maxima, e' um medicamento caro e raramente receitado, portanto super dificil de arranjar uma farmacia que o comercialize, e amanha a ver vamos se nao me trocam de quimico outra vez. Enfim, ca se anda. Aos tropecoes as vezes, mas ca se anda.

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    6. Eh pá, com efeitos secundários desses, não vale a pena. Caramba, há-se haver alguma coisa que resulte. No caso de me mate foi a combinação de dois (fluoxetina e bupropiom - este tem um efeito secundário bem fixe, diminuição da vontade de fumar, ele reduziu imenso e aderiu ao vape)

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  3. Aqui em casa é o homem que dá para esse peditório - sem vergonha nenhuma! Mas de quando em quando (sendo que o quando é agora, acho que entre a pandemia e a guerra e a crise e o raio vamos ficar todos chalupas) tem de ir arrumar a matéria cinzenta a um psicólogo. Não faço ideia do que lhe fazem, vem de lá muito melhor!

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    1. Goldfish, a terapia salva. A sério. Para algumas pessoas basta terapia, para outras é um complemento à medicação, mas é tão essencial. Acho que se poupava muito dinheiro (em baixas e medicação) se fosse uma valência do SNS, mas prontES.

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