sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Goodness gracious me

Não sei a que propósito, mas ocorreu-me enquanto andava a ler uns comentários sobre actualidades no feicebuque, a recordação de uma professora que me calhou no Instituto Britânico, quando lá andei (nos idos de oitentas e tais, na época em que os animais ainda falavam). Era uma senhora já de uma idade venerável, típica bélhota inglesa, com o seu cabelinho branco, pronúncia muito cuppa tea & I say, com aqueles saia casaco de tweed ou imitação, a figura parecia a encarnação de uma personagem da Agatha Christie. Vivia aqui no rectângulo já há 35 anos, a anciã. E falava um português semelhante ao verbalizado por qualquer vocalista de banda que passe por cá para dar um concerto, e se vê na contingência de cumprimentar com um "owbrigawdo Portiugawl". Juro. O vocabulário da senhora limitava-se ao estritamente necessário à sobrevivência. Trinta e cinco anos e falava pior português que eu inglês, e eu só contava 16/17 de vida. E ainda fazia humor relativamente aos nossos quirky, funny ways of life, pequenitas coisas que nenhum brit aturaria ou alguma vez acolheria como seus. Dear me.  E ainda usava aqueles sensible shoes ingleses, a pobre, daqueles que eu achava que eram uma obra de ficção, já esquecida nos anos cinquenta, sessenta, com um ar supinamente confortável, mas feiinhos que doía, biqueira larga, sola de borracha mas daquela cor creme semi-transparente, portanto, ainda nem tinha descoberto, no abundante comércio local, a qualidade e estética do calçado português. E pronto, era só isto. Penso que, atendendo à proveniência da criatura, tal reticência em se integrar, ao menos falando um português que não deixasse o padeiro, o empregado de mesa, o talhante, o merceeiro, com um esgotamento nervoso, remeteria para a qualificação da indivídua como excêntrica. Ou dona de um feitiozinho, vá. Agora querer correr com ela por isto e por, às tantas, deitar leite no chá, duvido que alguém o exigisse. Perspectivas.



17 comentários:

  1. Há um historiador inglês (Niall Ferguson) que atribui o "sucesso" da colonização britânica por onde passou, em parte, pelo menos, a essa "não integração" com as culturas locais (assim aconteceu na América, na Índia, etc.); pelo contrário, os ibéricos integraram-se que foi um Deus nos acuda (ah, o Carnaval do Brasil geminado com as Marchas de Alfama)...
    Claro que o Médio Oriente, no século XX, foi colonizado pelos britânicos e o "sucesso" está à vista. Malhas que os impérios tecem...

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    1. Xilre, há um sketch dos Monty Python em que o Cleese, vestido de oficial, se barbeia calmamente, enquanto fora da tenda está armada a maior confusão de batalha entre zulus e soldados ingleses. E aquelas imagens de chás no deserto, ou no meio da savana, de tenda montada, jantares de smoking. Sim, é a imagem do colonialismo britânico. Agora sucesso... bom, não lhes correu assim tãããão bem. E ainda hoje pagamos a factura.

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    2. Nesse soquete o que mais me espantava era a attitude do... "oh que chatice, comeu-te uma perna foi? Isso nao e' nada..." que agora compreendo tao bem!!

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    3. É, uma maçada, acordei assim :D

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  2. Izzie, nem mais. Os professores de línguas que tive na faculdade também eram assim. Muitos estavam por cá há décadas e continuavam a não dizer uma frase em português.

    Ontem cometi o erro de passar os olhos no feicebuque. Fiquei mal disposta. Fisicamente mal disposta, com o que por lá li. Tanta ignorância, tanta maldade, tanta estupidez. Tanto dizem que... tanto "eu conheço uma pessoa que conhece o primo do enteado da tia da sogra de um muçulmano e sei que eles...."
    Nojo, pá.
    Dulce/Porto

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    1. Dulce, outro dia estava a passar em frente de uma das muitas lojinhas de árabes que agora existem na minha zona, e dizia um para outro: "Tens de falar mais, treinar, senão nunca mais aprendes português!". E dizia isto sem tremeliques, e com uma pronúncia muito aceitável. E os chineses e outros asiáticos? Ui. Os filhos, então, vão começar a rebentar as escalas nas escolas, esperem para ver.
      (ando com uma urticária de feicebuque. acho que são pessoas maldosas e pequeninas, as que dizem certas coisas. piretes.)

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    2. Este verão, numa viagem de comboio entre Faro e Tavira fui a escutar uma conversa entre professoras (portuguesas). Diziam que era uma vergonha - para os alunos portugueses,-que a melhor nota de Português da escola, era de uma aluna chinesa, com apenas dois anos de Portugal e de português falado. Já rebentam as escalas. :)

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    3. Mep, lá está. entre os orientais ainda se cultiva um respeito grande pela aprendizagem. Já os imigrantes de leste o faziam, mas esses, entretanto, foram quase todos embora.

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  3. Os professores do British ainda são assim. Nos nómadas - aqueles que dão aulas por 6 meses e abalam - ainda se justifica, nos outros, que vivem cá há anos, não há paciência.

    Com excepção de uma professora, penso que todos sentem uma certa curiosidade em ver tantos (bons) alunos vindos de um país que eles devem considerar ser de grunhos.

    É por isso que, quando se praticava o speaking, me irritava a exigência que se falasse como se fôssemos alunos de Eton. Os gajos estavam aqui há anos e nem sabiam dizer o básico e nós tínhamos de soar como os nativos?

    Claro, um imigrante - que eles tb são, embora gostem do nome pomposo de expatriados - vindo da Ásia ou de África é que tem obrigação de falar um português perfeito.

    O Martim Moniz é Portugal, algumas zonas do Algarve, já nem sei.

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    1. Os professores do Britânico eram cá uns cromos. Tive um que nunca vestiu um par de calças que não tivessem um ar de terem sido amarrotadas de propósito. E tinha uma gravata toda desfiada. Acho que eles até faziam gala em se mostrarem "excêntricos". E sim, era unânime que percebiam que nós, tugas, éramos espectaculares no inglês, mas ainda assim achavam muito engraçado que uns patuscos como nós soubéssemos fazer alguma coisa em bom.

      O Martim Moniz é espectacular, e está a ficar um sítio muito decente: mais limpo, mais convidativo. Uma misturada incrível. E só vejo vantagens nisso.

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  4. Os únicos que não eram idiotas eram, que eu tivesse encontrado, os que vinham da Nova Zelândia e da Irlanda.

    Fiquei amiga de uma professora irlandesa, ela própria considerando idiota a exigência que pessoas que não falam inglês na sua vida diária soassem cm nativos eruditos.

    Agora, nos níveis mais elevados, só há advogados, médicos e engenheiros. Isso deve espantar um pouco o bife que nos considera meio alarves.

    O que me irritava mais é a atitude nos comboios, restaurantes, etc. Eu, portuguesa, chego a sentir-me como uma intrusa.

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    1. A mim calhou-me sempre ingleses de gema :( mate teve uma que ou era irlandesa ou escocesa e fazia cerveja artesanal na garagem. diz que era uma fixe.

      (eu gosto muito de ingleses, mas é gente difícil para convívio próximo, principalmente quando sentem a necessidade de se afirmar como superiores. chegam a ser desagradáveis, e é preciso dar-lhes uns tabefes.)

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  5. Ainda ontem uns amigos ingleses, emigrados, comentavam o facto dos ingleses nem se quer se denominarem "emigrantes" mas "expatriados" e toda a superioridade racial que isto lhes trazia, que ainda se gabam de viver num pais uma porrada de anos sem falar a lingua.

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    1. Uns são imigrantes, outros expats, é uma questão de estatuto. nunca percebi.

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  6. Caso saiam da UE, será interessante ver como agirão esses imigrantes.

    (Admito que acho alguns homens ingleses de cair para o lado mas isso já é outra dimensão).

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  7. Ai a sacana veio para o nosso país, nunca se integrou, não aprendeu a língua e ainda ocupou um emprego que podia ter sido alocado a um dos "nossos"? Anda que eu vou já dizer ao PNR e aos outros indignados nacionalistas de facebook.

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    1. Elsinha, todos os profs do britânico eram natives de um país de língua inglesa, não tiravam jobs aos nacionais. Mas sim, toda a razão, já se nacionalizava o ensino do inglês, expats chupistas rua! :D

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