Volta e meia dão-me umas ganas, uns nervos, e ponho-me a passear por lojas online, oohhhhhh, que vestidinho tan windo, óóóóó, sapatinho fofo, mas não compro nada, nem sequer faço um cesto de compras que nunca seguirá para o check out. Não é maturidade, não é capacidade de lidar com a frustração, é outra coisa, não sei explicar bem o quê, talvez bicho que se me pegou com esta pandemia. Continuo com vício de lamber montras, reais ou virtuais, mas não me apetece comprar. Ou antes, quando chega ao momento de pegar e ir provar dá-me um quebranto, uma fraqueza, que desisto. Nada, nada me parece valer o esforço de ir para o provador, descalçar, despir, vestir, e voltar a despir, vestir, calçar. Ah, mas online poupa-se esse trabalho, sim, mas tanto fisicamente como virtualmente sai a pergunta, porquê?, ou para quê?, afinal tenho os roupeiros cheios, por mais roupa que siga para dar; e em dois anos vesti e calcei o quê, um terço das existências? É, o bicho pandemia comeu-me a vontade de esbardalhar dinheiro em coisas de vestir e calçar. Já em livros, tchi, se tivesse vergonha nem contava. Encomendo online mas vou levantar fisicamente, que ninguém tem tempo e pachorra para esperar pela encomenda. Já que lá estou, bom, aproveita-se para ver as novidades e, de repente, lá estamos a descobrir mais uma coisinha que até queria já ter mandado vir, e pronto, felicidade instantânea e duradoura, que um livro não é só a alegria de descobrir, folhear, comprar, trazer; é também a de esperar a vez para ler, ler, e depois recordar. E em sendo BD (no caso, foi, daí encomendar online, um gajo nunca sabe em que loja há), reler. Que releio. E agora estou mortinha por ir para casa e começar.
quinta-feira, 18 de novembro de 2021
terça-feira, 9 de novembro de 2021
Um filme, uma série, e um bónus
Comecemos pela perfeição, porque é uma excelente maneira de começar. Desde já: não li o(s) livro(s), detestei a versão do Lynch (e já pouco me lembro), ia completamente em branco. Acompanhada do excitex de me mate, que não só leu e possui todos os livros (sim, mesmo os escritos pelos filhos), como os leu várias vezes. Estima ele que o primeiro foram umas cinco. E sabe recitar de cor “I must not fear. Fear is the mind-killer. Fear is the little-death that brings total obliteration. I will face my fear. I will permit it to pass over me and through me. And when it has gone past I will turn the inner eye to see its path. Where the fear has gone there will be nothing. Only I will remain.” Um fanzorro.
Resumindo: a-do-rei. Mesmo, tipo, muito, paletes, bués. Me mate também, o que é bom sinal.
Uma única (e sentida, e chorada) crítica: a iluminação nas cenas à noite, terrível. Li pelas internets que deviam chamar ao filme "pessoas a murmurar no escuro", o que também é um exagero, lá a ver. Gostava de saber se em Imax a coisa melhora, mas neste formato só no Colombo, e eu preciso de carradas de incentivos para por os pés no Colombo. Carradas elevado a dez, num fim de semana.
Enfim, estética perfeita, conta lindamente a história, o elenco é um luxo (e eu, que embirro com o Timóteo Chamamaleto, deixei de embirrar), cenários de tirar a respiração, e é mesmo experiência imersiva que muitos falam.
E série? Esta. Portuguesa na netflix, o que já é de assinalar, yay. E com o Adriano Luz, novo yay. Realizada por Tiago Guedes, de quem adorei A Herdade, mais um yay.
Declaração de interesses: o meu avô materno trabalhou na Raret (não no retransmissor da Glória do Ribatejo, mas na Maxuqueira, onde eram recebidas as transmissões vindas da Alemanha, e depois retransmitidas para os países para lá da cortina de ferro a partir do posto da Glória). Desde miúda que palavras como Raret ou BêÓQuê faziam parte do meu léxico, e sabia, ainda que por alto, o que era aquilo. Donde, a curiosidade era imensa.
E a série, que tal. Pois que está mesmo muito bem feita, níveis de produção à estrangeira, nota-se que há muito dinheirinho ali (bem) empatado, bem hajam. Porque fica provado que cá se pode fazer coisas tão boas como lá fora, toma. A realização é, ó, daqui; o elenco é uma categoria, o texto sim senhora, os figurinos e cenários de tirar o chapéu.
A história não se cinge apenas à actividade da Raret e inclui, digamos assim, um belíssimo retrato da época, Estado Novo, Pide, Guerra Colonial, ruralidade, resistência ao regime. Um aplauso do primeiro ao nono episódio, que engolimos entre sexta à noite e sábado à tarde (não, não temos grande vida social, so what, semos o que somos).
A chatice é o décimo e último episódio. A última meia hora, vinte minutos, vá. A coisa estava a correr tan ben, e tau, foram armar-se em argumentistas à amaricana, a criar um final que ainda não percebi bem (nem vou contar, não sou uma spoilenta nojenta), apesar de ter criado uma explicação que para mim funciona, e não me estraga o resto da série. Digamos que às vezes as pessoas pensam que se vai fazer uma cena à Sopranos e sai um Lost. Ok, muita gente não gostou do final de Sopranos, mas a) é muito bem esgalhado; b) tem cojones; c) não pretende agradar a ninguém; d) é coerente dentro do tipo de narrativa. Aqui, bom, e sem spoilar, acho que não só deixam evidente a prostituição ao "paguem aí uma segunda temporada que a malta faz", como rasgam, não, trituram uma regra de argumento que adoro muito, a coerência da narrativa. "Ah, armada em dótóra esqueritora, mas já escreveste alguma série"; não, mas já vi muitas. "Ah, a dizer isso toda coisa, mas ósdepois adora um filme de fiquessão científica em que é tudo inventado, tudo, pah". Pois é, mas no Dune, como na melhor FC, há uma coerência sistemática, ou sistematizada que. não. falha. Crias uma realidade completamente nova, crias regras, história, um cânone, e se o rasgas só sei lá por que capricho, pumbas, estás lixado que o mundo nerd não perdoa.
Ora numa série que é obviamente de ficção, mas baseada em acontecimentos reais, convém não esquecer a parte do "real" onde se ancora. Se foge muito, estraga. A suspension of disbelief a que o espectador está disposto não é tão elástica quanto se quer. Calminha com a imaginação a galope, rédeas nisso. E o final, conclusão, wrap up do décimo episódio é uma cagada em três actos, pardon my french. Não cola. E se eu tenho uma elasticidade nestas coisas, ó, que ainda no domingo mamãe (ela conhecia bem o trabalho do meu avô), quando lhe falávamos da série, largou uma que estragaria o macguffin todo, e sem o qual não haveria série. Ou metade dela. E não me ralou por aí além, porque ainda que inventado, está bem metido e é credível. Já o final-final?, nope.
Anyhoo. Vale muito a pena, ainda assim.
E agora, o brinde.
Não tenho palavras quanto a este sketch, a não ser "Brava!"
quarta-feira, 3 de novembro de 2021
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