sexta-feira, 2 de junho de 2017

Não acho normal (ou um post na onda do "sou só eu?")

- Que alguém se queixe que lhe dói a perna, por causa disso não se mexe normalmente, e ai o incómodo que tal lhe causa; e vir alguém remoer qualquer coisa como a ti dói-te a perna hoje, a mim dói já para cima de um mês, não te queixes, sabes lá o que é sofrer, sofrer sofro eu e estou aqui viva e não me queixo. A sério que não topam a ironia?

- Um agente fardado fazer uma selfie num local muito sensível em termos de segurança, pronto, uma pista de aeroporto, com um avião de uma banda de rock em fundo - e, se fosse gaja para isso, até se consegue, pelos prédios em fundo-fundo, perceber que pista ou local é - naquela do sou muita cool, e a minha corporação publicar isso na sua página, porque, lá está, também é muita cool. E não pode um gajo-cidadão-civil levar uma porra d'uma auguinha, não vá tratar-se de não sei quê para rebentar sei lá o quê.
(note to self: aqui no meu bules também, de quando em vez, aparecem umas figuras; fazer selfies com ditas em fundo e publicar)
(note to else, em aditamento: outras situações também muito giras, para polícias fardados ou outros profissionais fazerem selfies e publicar nas redes sociais: juiz/procurador na sala de audiências, com um arguido famoso; polícia com o meliante que acabaram de catar, à porta da esquadra; o médico/a no bloco de urgência, com cara de ooops, e paciente agora cadáver que não foi possível salvar; enfermeiro/a no bloco de partos, com o recém nascido preso pelos artelhos; assistente social com os mitras do dia; agente funerário a fazer a rábula de bater na madeira do caixão; assistente de bordo a deitar gotas de laxante no café; solicitador de execução com o tipo das chaves do Areeiro, a arrombar a porta da fracção que vão penhorar; qualquer cidadão a fazer corninhos ao presidente; tudo bastante dignificante, e adequado para mostrar a tooooda a gente)

- Existirem pessoas que devolvem crianças que receberam com vista à adopção. Até eu, que sou uma besta insensível (encartada! diplomada!) me arrepiei até ao tutano com o número de "devoluções" registadas num só ano e, pasme-se, a maioria de crianças pequeninas, mas mesmo, mesmo pucanichinhas. Nestas alturas gostava de acreditar em deusnossosenhor, para poder dizer que o altíssimo lá sabia, quando fez esta gente estéril (eu sei que nem toda a agente que adopta o é, mas adiante), mas depois também me ponho a pensar que raio de phoda é a selecção e acompanhamento das adopções, para haver estas situações. Pá, até eu - a tal besta insensível - sei que isto de filhos é uma lotaria, venham eles de dentro ou de fora, e que haverá muitos dias que aos pais lhes apetecerá esganar / abandonar no mato / rifar* os seus pequerruchos, mas precisamente o que define um pai/mãe é a incapacidade de desistir, o nunca ver um rebento como um caso perdido. Se não são capazes, olha, arranjos florais, peluches, cadernetas de cromos, macramé, todo um manancial de coisas para se entreterem e que, não correspondendo às expectativas, podem por de lado sem mal de maior.

[*mamãe dizia muitas vezes que um dia me rifava. e eu respondia que ninguém comprava as rifas, e pronto, prejuízo por prejuízo, ficávamos assim]

- [aditamento de fim de dia] Abriu em Lisboa um restaurante com o nome "colonial". A sério. Muito a sério. Porque não há nada mais shick, para não dizer shock, para celebrar e assinalar, em toda a nossa história, que esse período. O orgulho, de facto.
Da descrição no site:
Café Colonial is a place for conversation and sense of community, creating a feeling of a melting pot from Portuguese heritage around the world.
Ah, o sentido de comunidade que se vivia nesses dias, de facto.
E a paparoca? De truz, decerto:
Café Colonial dining experience is a celebration of the Lusophony roots through Portuguese and international dishes reflecting the influences of Portugal around the world especially in Brazil, Africa and Asia.
Epá, eu nem tenho palavras.
Já no menu:
"The roots of lusophony through traditional and contemporary dishes that reflect the portuguese identity and the influences from South America, Africa and Asia with a combination of flavours that will linger in your memory. Let yourself be surprised by this journey of flavours discovered by portuguese all over the world."
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Vou mazé de fim-de-semana, que sou uma pessoa doente e não me posso enervar.




22 comentários:

  1. Ainda esta semana li um artigo sobre crianças psicopatas e uma das histórias era sobre uma criança que tinha sido adotada bem pequenina e que depois veio a revelar-se psicopata (tentar estrangular a irmã mais novinha várias vezes, ter matado o hamster da irmã, dizer muito calma que um dia matava a família toda - isto tudo antes dos 6 anos, muito à We Need to Talk About Kevin'). A miúda teve que ser internada numa clínica especializada em que tentam reabilitar estas crianças tentando que a parte do cérebro que gera a empatia se desenvolva, e mais outras técnicas. O meu primeiro pensamento foi: é impossível que este casal não se tenha arrependido de a ter adotado. Mas aí é que está, nunca desistiram dela, numa situação tão extrema que sincersmente não sei se alguém os podia recriminar se o tivessem feito... Qual é a desculpa para esses outros pais?

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    1. Esse é um daqueles casos em que acharia justificada a devolução, porque estaria em causa a segurança de outra criança. Mas, ainda assim... a verdade é que a criança não tem culpa de ser assim, provavelmente é um resultado da vida que teve nos primeiros tempos. Ou uma lesão cerebral, sei lá, mas se fosse filho biológico acho que ninguém teria dúvidas que abandonar seria errado.
      O número de devoluções que vi era de 42 ou 43, num único ano. Acho um absurdo, alguma coisa terá de explicar isto. A notícia não revelava as justificações, mas dava a entender que a maioria teria que ver com não adaptação.
      Conheço uma pessoa que esteve 4 anos e meio à espera, depois de seleccionado, para adopção singular. Finalmente aconteceu, um garotinho de 4 anos. A criança trazia bagagem, claro. Segundo me relatou era desafiante, roçando o mal educado e confrontacional. A pessoa perdeu uns 15 quilos, virou a vida do avesso, investiu imenso, emocionalmente. O miúdo começou a desabrochar, ganhou peso, cresceu, acalmou, passou a ter melhores hábitos alimentares, mais educação, em seis meses, hein! E a pessoa não se arrependeu um momento (apesar de ter confessado momentos de desespero e dúvida), e confessa-se muito mais feliz desde que tem o filho. Isto sim. Até eu, besta insensível, lacrimejei.

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    2. Eu tenho uma irmã com síndrome Prader-Willi (é uma raríssima). Digamos que é parecida com a síndrome de Down, mas o "defeito" é no cromossoma 15.
      Uma das características desta doença é as alterações bruscas de comportamento. A minha irmã vai da doçura à agressividade extrema e vice-versa em segundos.
      Éramos 6 irmãos: ela é a terceira, eu sou a mais nova. Lembro-me dos constants sobressaltos lá em casa quando éramos miúdas: batia-nos, fugia de casa, atirava-nos pedras, às vezes parecia possuída, até ficava desfigurada. Eu tinha medo dela.Muito medo.
      Sem qualquer apoio, a minha mãe fazia o que achava certo para proteger os outros filhos - às vezes fechava-a no quarto até ela se acalmar. Uma dessas vezes desfez a porta a pontapé... enfim dá para imaginar mais ou menos o calvário que passámos.
      Tem agora quase 60 anos. A doença foi-lhe diagnosticada há pouco mais de 10 anos, quando foi detida por ter agredido um vizinho. Começou a ser medicada, mas como tem vontade própria, às vezes deixa de tomar a medicação. E lá voltam as crises. Chega a ser perigosa (ainda há uns meses ameaçou outra das minhas irmãs com uma faca).
      E não foi adotada, masceu do mesmo ventre que eu e as minhas outras irmãs. Abandoná-la? Não me surpreenderia saber que uma ou outra vez tivesse passado tal ideia pela cabeça dos meus pais. Eu própria em pequena desejei muitas vezes que ela desaparecesse das nossas vidas. Tantas vezes.
      Para mim, uma criança adotada é uma filha, irmã, prima, sobrinha, etc. etc. Não se abandona, não se devolve à procedência. Ponto.

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    3. Esqueci-me de assinar: Dulce/Porto

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    4. Prader-Willi é dose. Conheço uma pessoa que trabalha com pessoas com deficiência mental, teve uma situação, e contava-me essas alterações de humor, as fomes insaciáveis. Muito difícil de lidar. Lá está, é uma lotaria, nunca se sabe o que pode calhar. Tal como não se sabe se a criança terá um problema ou doença física, até incurável. Trata-se, lida-se com isso. Não é fácil, mas a vida não traz garantia de facilidade.
      E concordo, não se abandona. Pede-se ajuda, faz-se o que se pode, mas não se vai estigmatizar a criança, que não tem culpa nenhuma da merda de sorte que também lhe saiu na rifa.
      (admiro-lhe a força e lucidez. um abraço forte!)

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    5. Ah, és tu! Olha, abração. Daqueles. :*

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  2. O caso das "devoluções" infelizmente não me surpreendeu apenas e só porque, infelizmente, lido mais ou menos de perto com essa realidade. Na casa onde faço voluntariado já aconteceu duas vezes com crianças de 3/4 anos. Destas duas, uma foi adoptada por gente como deve ser e a outra ainda lá está - tem agora 7/8 anos. Esta criança perdeu a capacidade de sonhar. Mudou completamente: tornou-se agressiva, birrenta, não dorme, dá cabeçadas nas paredes quando a contrariam, caíu-lhe o cabelo, e ficou com a pele toda cheia de borbulhas. Agora está melhor, mas foi precisa muita paciência, muita sessão com a pedopsicóloga, muito esforço de todos lá de casa, para se conseguirem ver algumas mudanças.
    Quando uma criança sabe que vai ser adotada, que vai ter uma família, anda ali uns dias entre a felicidade e o terror absoluto. Por um lado, fica feliz porque vai ter uma família (não imagines o que é eu chegar à casa e ver uma criança de bracinhos abertos a corer para mim e a dizer: olha, sabes, vou ter uma papá e uma mamã). Por outro lado, anda apreensiva, cheia de medo, porque não sabe o que lhe vai calhar na rifa. A criança é acompanhada, toda a gente (técnicos, funcionários e até voluntários como eu) tenta responder às inúmeras perguntas que faz: e depois? a mamã vai gostar de mim? e o papá vai pegar-me ao colo? e o meu quarto? e vou ter um gato? e a casa tem jardim? Desde as perguntas mais difíceia de responder às que parecem (a nós) mais simples, mas que indicam sempre uma certa insegurança e medo do desconhecido.
    Depois vão para casa da família, não é fácil a adaptação (de ambos os lados), e depois, de repente, a família decide que ela não presta, que não é digna de lhes pertencer, que é má ou que tem defeito.
    Não consigo conceber e não quero sequer fazer esse esforço)que haja uma alminha que leve para casa uma destas crianças e que as devolva como se se tratasse de um eletrodoméstico com defeito. Bestas! (é mesmo assim, sem dó nem piedade: grandes bestas!).
    Comentei esse artigo aqui no escritório e lá veio a conversa: não sabes os motivos que levam as pessoas a tomar uma decisão dessas e blá, blá, blá... não, não sei, mas não consigo perceber. Mesmo.
    Desculpa, mas este é um assunto que mexe muito comigo.
    Dulce/Porto

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    1. Também mexe muito comigo, Dulce. Nem imaginas. É uma facada nas costas da criança, uma dupla rejeição, é dizerem-lhe que ela não presta, como dizes. Não entendo.
      Já não entendo devolverem bichos, quanto mais. E caraças, tenho lá dois anti-sociais em casa e um bebé que nos acorda às cinco da manhã a dar dentadas. Vou fazer o quê, pô-los à porta de casa? Nem pó. Agora imagine-se uma criança.

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  3. Não, uma criança não se "devolve". Uma criança não se abandona.
    Revolta-nos as entranhas pensar que 43 crianças voltaram para a guarda do estado após terem iniciado o processo de regressar a uma vida familiar estável.
    Mas deixem-me fazer-vos várias perguntas sobre o que tenho andado a pensar depois desta notícia:
    - Porque é que há um período de experiência? É para que os pais sejam avaliados? É para que pais e crianças possam rejeitar aquela solução? É para quê?
    - O processo de adopção destas 43 crianças falhou porque 43 pessoas/casais decidiram que dava muito trabalho, porque os miúdos se recusaram a ficar, porque os avaliadores concluíram que não era a melhor opção e não permitiram a conclusão da adopção?

    Só conheço casos de sucesso nas adopção e em todos os casos há uma premissa básica: os pais estavam desesperados por um filho. Custa-me a crer que aqueles pais desistissem à primeira (ou à centésima dificuldade), portanto esta "notícia" deixa-me desconfortável.
    Parecem-me números (que doem, é verdade) que estão despejados no papel para chocar, para gerar "partilhas" à custa da indignação e do sofrimento destas crianças e provavelmente de alguns destes pais.

    E só mais uma coisa, uma criança que passa pelo "sistema" está (mais ou menos, mas geralmente mais) traumatizada. Por mais que os adultos considerem estar preparados para assumir essa responsabilidade há, claramente, casos em que não estão (e aqui parte da responsabilidade está nas equipas que são responsáveis pela permissão da adopção). Mas e casos de pura incompatibilidade? Não estamos a falar de crianças que nasceram e cresceram numa família, estamos a falar de crianças que passaram por abusos e traumas que eu nem consigo imaginar. Será que desistir de completar o processo de adopção numa casos em que é absolutamente impossível fazer daquela criança uma criança feliz, é assim tão errado? Mesmo que desistir seja feito à custa de muito sofrimento?
    Uma vez mais digo que "uma criança não se devolve, nem se abandona. Nunca."
    Mas aquela notícia, pela leviandade que contém irrita-me.
    Posso estar absolutamente errada, falo com 0 conhecimento de causa. Mas tenho esta mania de tentar ver o cinza das coisas.


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    1. P., acredita, também me coloquei essas questões.
      - Sobre o período de experiência, penso que se trate da confiança com vista à adopção, e que terá de anteceder esta. A finalidade é nobre, ou seja, assegurar a integração; mas na prática estará a ser uma espécie de período de garantia das próprias crianças. É que eu admito, na boa, que as crianças rejeitem a família à qual são confiadas, mas o contrário, pá, não me passa.

      - Seria interessante, para não dizer primordial, analisar as causas de todos os falhanços. E saber se não estão a ser contabilizadas como devoluções situações de puro insucesso, em que as crianças rejeitaram a solução ou os organismos detectaram riscos para a criança. Se, como a notícia parece veicular, se trata de situações de 'mudei de ideias', ou 'esta não serve', bom, é inaceitável. Seria com um animal, com uma criança ainda mais.

      Finalmente, não me choca que, havendo casos de pura incompatibilidade, a criança seja retirada. O processo de adopção gira à volta da criança, é pela criança, e não para satisfazer uma necessidade dos adultos candidatos a adopção. Mas se essa incompatibilidade parte de uma frioleira dos candidatos a adopção, bom, são pessoas a riscar, pura e simplesmente.

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  4. Eu também sou voluntária num centro de acolhimento e tenho sentimentos mistos em relação às devoluções. Primeiro chutam esse número sem falarem em quantas adopções bem sucedidas há todos os anos. Custa me perceber as devoluções em crianças tão pequeninas e já vi crianças no centro com 8/10 anos a terem 2 ou 3 processos de adopção que ficaram a meio (nao sei se são consideradas devoluções) e sempre achei incrível como mesmo assim os miúdos partem para um novo namoro com outra família com a mesma esperança. Posto isto, estes miúdos trazem uma bagagem que não é para qualquer um. Não é impossível (há um miúdo no centro com perfil de não adotável e eu discordo, acho que com o perfil certo de família, seria possível) mas não é mesmo para qualquer um. E aqui vai a uma opinião muito pessoal: as pessoas partem para a adopção cheios de sonhos e com o espírito da caridadezinha, o tal espírito para o qual as crianças se estão cagando. Por isso às tantas não sei que expectativas tinham estes país que devolveram os filhos, se alguém lhes transmite honestamente as dificuldades que podem encontrar.

    Já vi um caso de devolução por uma questão muito complicada com a qual a maioria das pessoas que criticam não seriam capazes de lidar. Por isso vejo esta notícia com muita cautela. É importante pensar o que pode estar a falhar mas partir do pressuposto que todos estes país que devolvem são péssimas e horríveis pessoas não ajuda em nada.

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    1. Fuschia, penso que se a rejeição partir da criança, se esta tiver noção de que a adopção não se deu precisamente para a salvaguardar, porque ela é o centro do processo, é possível não existir o estigma de rejeição. Numa criança com menos de 6 anos é que me parece mais complicado, incutir-lhe essa noção. Nessas idades muito tenras tendem a ver o mundo de uma forma muito centrada, e a internalizar culpa se algo não corre bem.
      Sei bem que a bagagem destas crianças não é para qualquer um. É suposto o processo de triagem e formação de candidatos a adoptante informar disso. Mas não tenho ilusões de que muitos manterão ideias cor de rosa, a imagem de que o amor salvará, ou que o orfãozinho será muito grato, complacente, adorável. E o normal é ser desafiante, precisamente para testar limites, por à prova os adoptantes. Yep, os putos querem saber se aquelas pessoas estão aptas a amá-los, protegê-los, haja o que houver. A criançada é mais evoluída e complexa do que se pensa.

      Finalmente, se nestes casos são incluídos aqueles em que o processo falhou para todas as partes, a criança não cria laços, e os organismos entendem não ser aconselhável avançar, claro que não estamos perante pessoas horríveis. Mas se a desistência parte dos adoptantes, lamento, mas tenho de tomar partido pelas crianças. E concluir que algo muito fundamental falhou, seja dos candidatos (repito, fariam o mesmo a um filho biológico), seja dos serviços.

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    2. Continuo a dizer que depende dos casos, mas não vou entrar em pormenores. Olha uma das coisas que me fez confusão quando entrei no centro foi perceber que os miúdos que estão para adopção, muitas vezes têm a família (pai ou mãe ou ambos, ou avó, ou tia) a viver duas estações ao lado. Às vezes até os visitam ao fim semana ou em dias de festa ou visitam eles o centro. Ou seja, não são propriamente pessoas que vivem lá longe e que não temos a certeza se vivem ou morreram. Simplesmente, pelos mais variados motivos, não se conseguiram organizar (e chega-se a esta conclusão por várias tentativas, acho que não se desiste da família biológica de uma maneira leviana) e decidem (técnicos, tribunal, não sei mais quem) que a criança seja colocada para adopção. Alguns miúdos até têm utilização restrita do telemóvel e facebook para que o contacto com a família biológica não penalize o processo de ligação a uma potencial família adoptiva. Mas eu acho isto muito violento e angustiante. Independentemente dos maus tratos e abusos que possam ter havido, é difícil para uma criança desligar-se da sua família biológica quando ela existe, mesmo que seja colocada para adopção.

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    3. O pior mesmo são casos de negligência por falta de informação ou formação, burrice pura, ou pobreza dura. Neste país não há meios para intervir junto do meio familiar, acaba por se tirar a criança à família, por pobreza. Esses casos resolviam-se bem com uma adopção aberta ou apadrinhamento civil, mas diz que não há quem queira esta opção.

      Aqui há tempos soube, por alguém que estava a tratar um caso desses, de uma situação em que o apadrinhamento era sopa no mel. Mas como este seria muito difícil acontecer, por falta de quem se proponha, iam dar parecer favorável a adopção, até porque era crianças extremamente adoptáveis, se percebes o que quero dizer. Mas amor não lhes faltava, faltavam era meios à família (por acaso monoparental), e havendo apoios aquilo fazia-se. Isto corta-me o coração.

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    4. Sim, isso é muito horrível. Mas mesmo quando se percebe perfeitamente que a família biológica é nociva, o afastamento pode ser cruel para a criança.

      Entretanto lembrei-m, será que alguém já lembrou de ver a taxa de adopções bem sucedidas por casais que já têm filhos (há muitos com imensos filhos biológicos e que adoptam!). É porque vende-se muito esta ideia do "não pode ter, adopte", quando me parece que até é mais fácil para pais que já tiveram filhos (e já perceberam que entre o filho imaginário e o real vão muitos passos) terem estaleca para receber estes miúdos.

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    5. Era muito interessante conhecer esses números, isso era. Haver um tratamento estatístico de casos, com inúmeras variáveis, para conhecer melhor a realidade, era além de catita importante.
      "Vender" a adopção como alternativa ou solução para não poder ter filhos biológicos não é correcto. Acho eu. Não é por aí.

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  5. Como mãe adotiva recém encartada, depois de ler a notícia, decidi não julgar, tal como decidi não julgar quando nos falaram dessas situações na avaliação. São tantas as possibilidades, tantas as condicionantes. Penso é que muitas vezes os candidatos estão possuídos por uma ânsia tal que não analisam bem aquilo que lhes é proposto. Adotar não é só amar. É entrar de olhos bem abertos para que esse amor possa crescer, conscientes do que podemos ou não aceitar. E nunca pode ser uma segunda escolha, nunca.

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    1. Sãozinha, eu admito, mesmo, que posso estar a ser injusta. Aliás, já não estou, agora, com os nervos e fúria que tinha quando escrevi o post. Mas revolta-me. Porque não consigo desligar da posição da criança, a mudar de armas e bagagens para uma casa e depois ter de lidar com a frustração de não ter resultado. Assim se pode estar a criar um borderline ou pior, um psicopata.
      Se calhar seria melhor ponderar um meio termo, um período de transição antes da transição, com visitas, fins de semana, sei lá. É um salto no vazio, tanto para a criança como adoptantes, um dia mudarem de casa e pronto, têm seis meses para ver se dá.

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  6. Sou mãe biológica e, desde há 2,5 anos, mãe adoptiva. Aperta-se-me o coração ver notícias destas, saber que há "devoluções" de crianças - só escrever a palavra me angustia e me faz pensar no que teria custado ao meu filho se alguém o tivesse rejeitado.
    Por mais que queira não julgar, no caso das crianças pequeninas, sobretudo, não consigo deixar de o fazer - ou os pais, ou os técnicos de adopção, alguma coisa falhou. Há muito a ideia cor-de-rosa de salvar uma criança que ficará feliz só de saber que passou a ter pais. Nas formações obrigatórias que existem durante o processo de adopção, e até mesmo antes, pois ninguém pode, hoje em dia, iniciar um processo sem passar por uma formação prévia em que essa ideia romântica da adopção é completamente desmontada. Aliás, coloca-se tanto a tónica nas dificuldades que me custa a acreditar que alguém avance para o processo sem estar efectivamente consciente daquilo em que se está a meter e ainda conserve tais ideais bonitos, mas falsos. Porque uma adopção significa uma ruptura com o mundo que antes conheciam, fosse ele o de uma instituição ou, como acontecia com o meu filho, uma família de acolhimento com quem ele tinha estado um ano inteiro, e a quem se habituara e considerava, obviamente, como a sua família nos seus tenros 21 mesitos, idade com que nos foi entregue.
    No meu caso, a adopção foi internacional e não havia período de pré-adopção: fomos conhecer o menino, convivemos com ele durante uns dias, dissemos que queríamos ir para a frente com o processo e só o pudemos trazer para casa quando já era legalmente nosso filho. Isso assusta, mas ao mesmo tempo cria uma inevitabilidade e uma responsabilidade acrescida que, se calhar, faz falta para que haja, quer consciente quer inconscientemente, um empenho total: não era à experiência, era a sério e para sempre e não podia correr mal, como não pode correr mal com um filho biológico.
    A vinculação é o mais importante para que uma adopção seja bem sucedida, e neste processo quem tem de compreender, ajudar, facilitar, ter uma paciência infinita são, obviamente, os adultos. Tudo o que nos custa está a custar mais à criança, e ela está em primeiro lugar.
    O facto de não ser o primeiro filho e de já estarmos na casa dos 40 ajudou-nos muito a ter calma, a relativizar as dificuldades, a arranjar paciência mesmo quando ela parecia esgotada.
    E, para concluir, que isto já vai longo e eu tendo a não me calar quando falo sobre este tema, digo apenas que o meu filho muito rapidamente se integrou, se ligou a nós e nós a ele (o que não quer dizer que tenha sido um processo fácil, que não foi), e é um rapazinho muito feliz pelo qual dou graças todos os dias a quem quer que seja que, lá do alto, o colocou no nosso caminho.

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    1. Zu, obrigada por este depoimento :)
      Agora mais a frio acho que, acima de tudo, é preciso estudar o que se passa, o que corre mal nos casos de insucesso e, se necessário, mudar procedimentos. Não posso falar de processos de adopção, que só conheço de ouvir contar, mas a posição da criança, no meio de tudo, deve ser sempre a salvaguardada. Se os adultos têm medo, e é legítimo que o tenham, ou inseguranças, deve-se sempre admitir que a criança os terá em muito maior escala.
      Ainda bem que no vosso caso houve essa compreensão e abertura, decerto contribuiu muito :)

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  7. Também contribuiu muito o facto de termos recebido o filho mais adorável do mundo e arredores :-))) É tão fácil gostar dele, entrou-nos direitinho pelo coração adentro.

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